Entrevista

"Uma desigualdade de gênero gigantesca", afirma Renata Gil, conselheira do CNJ

Na estreia do podcast Direito&Justiça, Renata Gil, conselheira do CNJ, discute a paridade no Judiciário e os desafios da cultura patriarcal nas decisões judiciais.

Na estreia do podcast do caderno Direito&Justiça, as jornalistas Ana Maria Campos e Maria Eduarda Lavocat entrevistam Renata Gil, conselheira do CNJ
     -  (crédito:  Guilherme Felix CB/DA Press)
Na estreia do podcast do caderno Direito&Justiça, as jornalistas Ana Maria Campos e Maria Eduarda Lavocat entrevistam Renata Gil, conselheira do CNJ - (crédito: Guilherme Felix CB/DA Press)

Na estreia do podcast do caderno Direito&Justiça, as jornalistas Ana Maria Campos e Maria Eduarda Lavocat entrevistaram Renata Gil, conselheira do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para tratar sobre a política de paridade dos tribunais de segunda instância. Renata Gil, que é conselheira do CNJ por indicação do Supremo Tribunal Federal (STF), abordou a importância da presença feminina na magistratura, os desafios enfrentados e o impacto de medidas afirmativas, como a Resolução 525/2023.

O que estabelece Resolução 525/2023 e qual o motivo de ela existir?

A gente tem uma desigualdade de gênero gigantesca nos tribunais, tem um mapa explicativo na "Justiça em Números". E, no caso específico do Distrito Federal, temos só 28% de mulheres no segundo grau (da magistratura). E aí as pessoas podem perguntar: por que é importante uma mulher julgando no segundo grau ou ter mulheres julgando em igualdade nas Cortes? Por que uma mulher na liderança do Parlamento? Nós nunca tivemos uma presidente da Câmara. Nunca tivemos uma presidente do Senado. Porque, na verdade, as políticas inclusivas de gênero não são pensadas pelos homens. A gente tem grande resistência para que essas políticas sejam, inclusive, discutidas, tanto no Parlamento como internamente. Então, a adoção, por exemplo, do protocolo com perspectiva de gênero, que é aquele protocolo em que todos os julgadores do Brasil precisam ter atenção a regras especiais na hora de julgar questões envolvendo mulheres, jamais seria aprovado se fossem só homens deliberando sobre isso, porque os homens não entendem as discriminações que as mulheres sofrem. É importante que a gente tenha mulheres à frente dos julgamentos e mulheres à frente das decisões no parlamento, porque só elas entendem as questões pelas quais passamos. Questões envolvendo, por exemplo, a violência obstétrica, a violência contra mulher e depoimentos das mulheres, elas não são aferidas adequadamente quando são conduzidas por homens, porque a gente entende que a sociedade ainda é patriarcal e a concepção dos homens que julgam ainda está muito permeada pela cultura patriarcal.

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Qual é o impacto, o poder, de uma decisão dessa, do presidente do CNJ (Luís Roberto Barroso), e ainda mais forte, porque tem também a assinatura do corregedor (Mauro Campbell), não só do presidente corregedor nacional de Justiça. Ela tem o impacto de realmente suspender a promoção ou isso pode ser discutido ainda no plenário do CNJ?

O plenário é o órgão soberano do Conselho Nacional de Justiça, a suspensão é muito categórica, porque avançou no conteúdo da decisão do Tribunal de Justiça, no sentido de que a resolução não foi observada, então, claro que isso vai ser ser reavaliado pelo pleno, mas acho que ficou muito claro na decisão suspensiva que deveria ter sido observado, integralmente, o conteúdo da Resolução 525. O que é muito importante as pessoas saberem é que toda resolução do Conselho tem um procedimento acoplado, que é esse "cumprdec". É exatamente a estrita observância pelos tribunais do que as resoluções que são editadas se dirigem. Se aquela resolução diz que tem que ser lista tríplice alternada feminina, tem que ser lista tríplice alternada feminina. Quando não é, há uma violação e, por isso, houve a efetiva suspensão.

 

E essa regra vale até que seja atingida a paridade, a proporção de 40% de mulheres e 60% de homens. A partir daí não não há mais exigência?

Exatamente. A resolução estabeleceu esse limite de 40%, porque nós entendemos que o ótimo é inimigo do bom. O ideal seria que nós tivéssemos 50%, porque, no Brasil, nós temos 52% de mulheres na população, o justo seria chegar aos 50%. Mas toda política é, primeiro, uma quebra de paradigma. Tribunais que estão acima dos 40% não necessitam mais que as listas sejam alternadas. O TJ do Pará tem 50% de mulheres, depois vem a Bahia, com 47,5%, Ceará, com 42,9%, e Sergipe, com 41,7%. (...) O TJDFT tem 28,9%, e o TJ Roraima e TJ Amapá não possuem mulheres em seus quadros.

 

postado em 26/06/2025 04:00
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