
A temporada de chuvas chegou para aliviar o calorão que assolava o Distrito Federal. No entanto, essa mesma chuva começa a preocupar os brasilienses. A capital começou a viver nos últimos dias o alerta amarelo de perigo potencial de chuvas intensas, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). Esses alertas se tornam mais preocupantes quando leva-se em conta que o DF tem em seu território ao menos 24 áreas de risco, conforme a Defesa Civil, as quais deverão enfrentar nos próximos dias intensos temporais.
Apesar de não ser o nível mais intenso de alerta — que na escala do Inmet vai até o vermelho, de risco muito alto —, o ponto amarelo requer cautela. Nessa situação, são esperadas chuvas entre 20 e 30 milímetros por hora, as quais podem chegar a 50 milímetros por dia, com ventos intensos entre 40 e 60 km/h. Isso representa risco de corte de energia elétrica, queda de galhos de árvores, alagamentos e descargas elétricas.
Siga o canal do Correio no WhatsApp e receba as principais notícias do dia no seu celular
Para se ter uma ideia, no início da semana tivemos um exemplo do que isso pode causar. As fortes chuvas que atingiram o Paranoá, na segunda-feira, deixaram um rastro de destruição. A força das rajadas de vento foi tão intensa que derrubou bombas de combustível em um posto da cidade. Nas imagens que circularam nas redes sociais, é possível ver algumas bombas caídas e outras prestes a despencar. Por sorte, somente foram registrados danos materiais, ninguém se feriu.
Se, para moradores do DF, como um todo, o panorama é preocupante, a situação é ainda mais grave para quem reside em áreas de risco. De acordo com o Serviço Geológico do Brasil (SGB), 2.100 pessoas vivem nessas regiões. A Defesa Civil tem registradas 11 regiões administrativas com territórios classificados como perigosos e suscetíveis a fenômenos de erosão, enxurrada, deslizamento e inundação. São elas: Arniqueira, Fercal, Gama, Núcleo Bandeirante, Planaltina, Recanto das Emas, Riacho Fundo I, Setor Habitacional Água Quente, Sobradinho II, Sol Nascente e Pôr do Sol.
Cotidiano
Moradora de Vicente Pires há 10 anos, Marinalva dos Santos, 44 anos, lembra de um episódio marcante durante uma forte chuva em 2023. "Eu estava no ônibus e chovia demais. Descendo a rua, vimos o carro de uma moça derrapar, e a água começou a invadir o veículo. Eu e mais quatro pessoas descemos e a ajudamos a estacionar e ficar em segurança", recorda.
Mesmo após as obras de drenagem realizadas na região, Marinalva diz que os alagamentos são frequentes em alguns locais. "Na Rua 7 mesmo, quando começa a chover, a gente fica morrendo de medo, porque parece que a água vai descendo e levando tudo embora. Tenho vários amigos que perderam o motor do carro por causa das chuvas aqui", conta. Para se proteger, ela evita sair de casa nos dias de temporal. "Se eu estiver na rua, procuro um abrigo e fico lá até a chuva parar. É muito perigoso. Prefiro me atrasar a me colocar em risco", afirma.
Na Estrutural, a rotina também é de apreensão durante a temporada de chuvas. Moradora da região há 12 anos, Laurena Dias, 26, lembra que teve prejuízos por causa dos alagamentos. "Meu carro ficou do lado de fora durante uma chuva no ano passado. Quando o temporal diminuiu um pouco, eu e meu marido fomos olhar, e a rua estava alagada, o carro submerso. Tivemos que pedir ajuda para tirá-lo. O motor não chegou a fundir, mas o interior ficou todo mofado", relata.
A vendedora explica que, nos períodos chuvosos, é comum que as vias da região fiquem intransitáveis. "É começar a chover, tudo alaga. Acho que é principalmente por causa dos bueiros, que não são limpos com frequência. Além disso, muita gente joga lixo nas ruas, e isso entope os bueiros. Quando a água vem, não tem pra onde escoar", observa.
Sem escoamento
O professor André Luís Brasil Cavalcante, do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental da Universidade de Brasília (UnB) explica que o panorama no DF é multifatorial, mas principalmente afetado pelo tipo de solo predominante na região — laterítico e saprolítico —, altamente sensível a água. O relevo acidentado, com áreas altas e vales encaixados, favorece o escoamento rápido da chuva para as partes mais baixas, o que contribui para o surgimento de erosões, deslizamentos e alagamentos. "É uma combinação de solos sensíveis, relevo acidentado e chuvas intensas. Quando chove muito de uma vez, o sistema natural não dá conta de infiltrar e drenar essa água", completa.
Grande parte dos problemas que afetam o DF, segundo Cavalcante, está relacionada à ocupação irregular do solo e à expansão urbana desordenada. "O asfalto, as construções e os aterros impedem a infiltração da água, que acaba escorrendo em excesso e sobrecarregando o sistema de drenagem", diz. O professor lembra que muitas dessas áreas não contam com infraestrutura adequada, o que agrava o risco de alagamentos e enxurradas. Como alternativas, ele defende o uso de mapas geotécnicos e ambientais para orientar o crescimento urbano e o investimento em drenagem sustentável. "Com engenharia, tecnologia e planejamento urbano, é possível conviver bem com o regime de chuvas do DF — o problema é quando a natureza é ignorada", alerta.
Cavalcante também destaca que a tecnologia tem se tornado uma aliada importante na prevenção de desastres naturais. Ele coordena o grupo de pesquisa GeoFluxo, da UnB, que desenvolve sistemas de monitoramento em tempo real com sensores capazes de medir chuva, umidade do solo, pressão de poros e movimentação do terreno. "Esses dados são enviados via internet das coisas (IoT) para plataformas digitais que processam automaticamente as informações, combinando big data, modelagem geotécnica e inteligência artificial", explica. O resultado são mapas de suscetibilidade e alertas preventivos emitidos quando há risco de deslizamento ou enchente.
Alertas
Atualmente, é possível receber alertas da Defesa Civil para situações climáticas extremas — como alagamentos, enchentes, deslizamentos e vendavais — por SMS, TV por assinatura, aplicativo Telegram e aplicativo WhatsApp. Para se cadastrar pelo SMS, basta enviar uma mensagem com o CEP da área de interesse para o número 40199. No WhatsApp, o cadastro é feito ao adicionar o número (61) 2034-4611, enviar um "olá" e seguir as instruções do robô de alertas. No Telegram, é preciso buscar o contato "Defesa Civil Alertas", iniciar a conversa e escolher as regiões de interesse. Além disso, os avisos também aparecem automaticamente nas transmissões de TV por assinatura, garantindo que a população seja informada de forma rápida e acessível.
A pasta também iniciou testes neste ano para o novo Defesa Civil Alerta, que permitirá o envio de mensagens emergenciais diretamente aos celulares das pessoas que estiverem em áreas críticas. O sistema exibe a mensagem sobreposta à tela do aparelho, acompanhada de um som de sirene em casos graves, mesmo que o celular esteja no modo silencioso. A ferramenta não exige cadastro prévio e será gratuita para todos os usuários com smartphones compatíveis, geralmente os modelos lançados a partir de 2020.
Medidas
A Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap) também afirmou ter ampliando as frentes de trabalho, com inspeções em galerias pluviais, uso de robôs para identificar entupimentos e execução de obras em locais com histórico de alagamento, como Asa Norte, Asa Sul, Lago Sul e Ceilândia. Além de ter ampliado as operações de desobstrução de bocas de lobo, feitas de forma mecanizada por equipes da própria Novacap e pelo Consórcio GNN Drenagem.
Segundo a pasta, desde que o contrato foi firmado, em janeiro de 2024, foram removidas 241,6 mil toneladas de resíduos das redes pluviais do DF. Essa quantidade inclui entulhos, areia, folhas e materiais descartados irregularmente. Atualmente, a operação conta com uma frota de 20 caminhões capazes de realizar a limpeza mecanizada das galerias e bocas de lobo com alta eficiência.
No setor elétrico, a Neoenergia Brasília colocou em prática um plano de contingência para o período chuvoso, com a possibilidade de triplicar o número de profissionais em campo e no Centro de Operações Integradas. A distribuidora afirmou ter reforçado equipes técnicas, canais de atendimento e ações preventivas, como podas de árvores e manutenção da rede elétrica.
Mapa das áreas de risco
- Arniqueira (Chácara 127B, Cj 5, Lt 8A, Condomínio Beija Flor; Chácara 126A, Cj 5, Lt 3; Condomínio Residencial Park dos Eucaliptos): risco muito alto de enxurrada, alagamento, erosão e área suscetível a movimentação de massa
- Fercal (Quadra 4, Fercal I; Morro Queima Lençol e Capela Nossa Senhora Rainha da Paz): risco alto de deslizamento, erosão, colapso e enxurradas. Risco muito alto de voçoroca, movimentação de massa, alagamento, escorregamento e inundação.
- Gama (Quadra 49, Chácara 15, Setor Leste): risco muito alto de enxurradas, alagamentos, inundação, movimentação de massa e erosões
- Núcleo Bandeirante (Vila Cauhy; Rua 12A entre as casas 16 e 18 da Vila Metropolitana): risco muito alto de enxurradas, alagamentos, inundação, movimentação de massa e erosão de margem fluvial
- Planaltina (Núcleo Rural Córrego do Arrozal Chácara 1; Vale do Amanhecer CR85): risco alto de movimentações de massa, enxurradas, alagamentos, deslizamentos, inundações e colapso de edificações
- Recanto das Emas (Quadra 116 - Bacia de Contenção): risco alto de enxurradas, alagamento, rompimento de galeria de águas pluviais e movimentação de massa
- Riacho Fundo I (Placa da Mercedes, SPLM, Cj 7; Colônia Agrícola Sucupira, chácaras 24 e 14 e chácara 22): risco muito alto de enxurradas, alagamentos e movimentação de massa
- Setor Habitacional Água Quente (Condomínios Nova Betânia 1 e 2; Condomínio Salimão Elias): risco muito de enxurrada, erosão, alagamento, inundação e movimentação de massa
- Sobradinho II (Condomínio Mirante da Serra, quadra 1 e 4; Vila Rabelo 1 e 2): risco muito alto de deslizamentos, erosão, movimentação de massa, colapso, inundações, enxurradas, alagamentos e área suscetível a movimentação de massa
- Sol Nascente/Pôr do Sol (Chácara 74; Chácara 36, Vila Madureira): risco alto de Enxurrada, alagamento, erosão e movimentação de massa
- Vicente Pires (Chácara 229, Vila São José): risco alto de enxurrada, alagamento, erosão e movimentação de massa
Fonte: Demonstrativo Social 2025 - Subsecretaria do Sistema de Defesa Civil do Distrito Federal
Cuidados na chuva
Antes
- Procure abrigo em locais altos e secos
- Coloque documentos e objetos de valor em sacos plásticos e em local protegido;
- Coloque em lugares altos seus móveis e utensílios (bem protegidos);
- Retire os animais de estimação da casa;
- Desligue aparelhos elétricos, quadro geral de energia e feche o registro de entrada d’água;
- Retire todo o lixo e leve para áreas não sujeitas a enchentes;
- Feche bem as portas e janelas.
Durante
- Salve e proteja sua vida, a de seus familiares e amigos. Se precisar retirar algo de sua casa, peça ajuda aos órgãos competentes.
- Não volte para casa até as águas baixarem e o caminho estar seguro.
- Evite contato com as águas da enchente: elas estão contaminadas e podem provocar doenças e acidentes.
- Só entre na água se for absolutamente necessário. Proteja-se com calçados e botas.
- Não ingira alimentos que tiveram contato com as águas da enchente
Depois
- Tenha cuidado: veja se sua casa não corre o risco de desabar;
- Raspe toda a lama e o lixo do chão, das paredes, dos móveis e utensílios;
- Lave e desinfete os objetos que tiveram contato com as águas da enchente;
- Cuidado com aranhas, cobras e ratos, ao movimentar objetos, móveis e utensílios;
- Retire todo o lixo da casa e do quintal e coloque para a limpeza pública;
- Não use água de fontes naturais e poços depois da enchente, pois estão contaminadas
Fonte: Defesa Civil
Onde pedir ajuda
- DEFESA CIVIL - Disque 199
- CORPO DE BOMBEIROS - Disque 193
- Em caso real de emergência, DISQUE 100 que a telefonista o ajudará
- Em casos de emergência de energia, a Neoenergia atende por telefone (116), WhatsApp (61 3465-9318), aplicativo e Agência Virtual.

Cidades DF
Cidades DF
Cidades DF