
Manuela Sá* - Durante muito tempo, era comum ver o piscar dos vaga-lumes nas noites. No entanto, recentemente, cientistas ligaram o alerta para o risco de extinção desses animais. A aposentada Izabela Campos, de 66 anos, é uma das brasilienses que gostavam de observar os pirilampos. "Que coisa linda, única e rara um bichinho voador que brilhava e que, como um minúsculo sol noturno, ou como pequenas estrelas na terra, iluminavam e encantavam crianças e adultos. Sem que percebêssemos, foram ficando cada vez mais raros e, nossas noites, menos claras e mágicas", conta.
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O desaparecimento e a preservação desses insetos são o objeto de estudo de Stephanie Vaz, coordenadora regional da América do Sul para proteção dos vaga-lumes pela União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN). De acordo com a bióloga, em mapeamentos recentes, o que aparece como maior ameaça para os pirilampos é a perda de habitat. "Eles vêm perdendo espaço como consequência do desmatamento e uso de pesticidas", afirma.
Stephanie fala sobre outro fator de risco para os vaga-lumes. "Algo novo que tem sido estudado é o efeito da poluição luminosa sobre diversos seres, como morcegos, mariposas e mamíferos noturnos. Cientistas têm notado que, em áreas com iluminação mais potente, há menos vaga-lumes. É um padrão", explica.
Apesar de nem todas as espécies de vaga-lumes emitirem luz, esses insetos são conhecidos pelo brilho, também chamado de bioluminescência. Na fase larval, eles a utilizam para parecer que são tóxicos e enganar predadores. Já na fase adulta, a luz passa a ter outras funções: atrair presas e parceiros para acasalamento. Segundo Stephanie, o excesso de luz artificial à noite pode atrapalhar esse processo, contribuindo para a redução das populações de vaga-lumes.
A única luz do ambiente
A administradora Nívea Alencar, 62, lembra que gostava de brincar com pirilampos quando era mais nova, em uma fazenda próximo a Brasília. Na época, não havia luz no lugar, fazendo com que a família usasse lamparina. Apesar de ainda conseguir ver esses insetos brilhantes, ela nota ter diminuído bastante a quantidade. "Quanto mais luz aparece nos centros urbanos, mais eles somem. Vaga-lume parece que é meio metido, gosta de ser a única luz do ambiente", brinca.
A psicóloga e educadora Lydia Rebouças, 65, também tem lembranças desses insetos de quando morava em uma chácara perto do Gama com seus filhos. À noite, ela e as crianças iam para o jardim e apagavam todas as luzes para ver vaga-lumes. "Aquilo era tão mágico, tão bonito. Hoje, eu tenho netos e também conseguimos ver os vaga-lumes nas entrequadras. Na época de chuva, quando está úmido, eles aparecem mais", lembra.
Lydia se preocupa com o sumiço desses animais: "As novas gerações perdem com a falta dessa experiência mágica. Perdem encantamento, que é fundamental para uma vida que tenha sentido e seja saudável. Encantamento é beleza, essencial para nossa existência", desabafa.
Iluminação pública
Para Lydia, a população pode se mirar no exemplo de Matureia (PB), primeira cidade brasileira a criar uma lei contra a poluição luminosa. A legislação prevê a substituição gradual das luminárias antigas por LEDs com baixa emissão de luz. A mudança foi feita com o objetivo de facilitar a observação astronômica e, dessa forma, fomentar o turismo na região.
De acordo com Steffania Cardoso, advogada especializada em direito urbanístico, para avançar na proteção desses insetos, é necessário pensar em projetos de iluminação pública que considerem a preservação da biodiversidade. "Os projetos atuais têm como prioridade aspectos econômicos e fontes de energia sustentáveis. Planejamentos que pensem na fauna ficam em segundo plano", diz. "É preciso pensar em economia, moradia e ecologia. As cidades vão continuar a crescer, porque a população precisa ter onde morar. Mas essa infraestrutura precisa ser bem planejada", acrescenta.
Para Steffania, uma iluminação que leve em conta a preservação da biodiversidade "precisa pensar na temperatura e na cor das lâmpadas, dando preferência a cores mais quentes, como amarelo, e equilíbrio entre luz e escuridão". Em centros urbanos, há a possibilidade de destinar espaços para a preservação. "Uma solução é a construção de parques urbanos, um espaço onde esses bichos possam viver em meio à cidade e haja garantia de escuridão à noite", sugere.
Menos insetos
Os vaga-lumes não são os únicos insetos que estão desaparecendo. Uma análise científica global, publicada na revista Biological Conservation e realizada pelos pesquisadores Francisco Sánchez-Bayo e Kris A.G. Wyckhuys, aponta que a população total de insetos no mundo diminui 2,5% ao ano. A análise também diz que os principais motivos para essa redução são as mudanças no habitat e a poluição.
Essa redução preocupa cientistas, porque, apesar do pouco tamanho, os insetos exercem diversas funções no ecossistema. Eles são a base da cadeia alimentar, por exemplo, servindo como fonte de alimento para aves, peixes, répteis e muitos mamíferos.
Esses animais também podem sinalizar quando a atividade do ser humano tem impacto negativo sobre o habitat. Determinados bichos, como vaga-lumes, são bioindicadores, ou seja, eles revelam a qualidade de um ecossistema.
Para a bióloga Stephanie, é importante acompanhar essas populações. "São seres sensíveis. Eles dizem se o ecossistema está bem", constata. A pesquisadora também destaca que, para manter o equilíbrio do meio ambiente e preservar essas espécies, "é preciso, acima de tudo, parar o desmatamento".
*Estagiária sob supervisão de Patrick Selvatti

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