Tributos

Arrecadação tributária do DF pode quase dobrar em uma década

Avanço foi de R$ 13,6 bilhões, em 2015, para um valor projetado de R$ 26,2 bilhões em 2025, aumento de 92%. Especialistas destacam crescimento da economia e aperfeiçoamento da fiscalização como fatores que contribuem para o resultado

Em uma década, a arrecadação tributária do Distrito Federal praticamente dobrou. De janeiro a setembro de 2025, o DF recolheu R$ 19,86 bilhões — alta de 5,6% frente aos R$ 18,81 bilhões no mesmo período de 2024 — e, mantido esse ritmo, o ano deve fechar com cerca de R$ 26,2 bilhões. O valor projetado representa 92% acima do montante arrecadado em 2015, quando o total foi de R$ 13,6 bilhões, e consolida um ciclo de expansão da receita local. 

De 2015 a 2025, a arrecadação do DF cresceu, em média, 5,8% ao ano. O aumento, porém, não foi linear. Após altas mais moderadas entre 2016 e 2019 — incluindo o menor avanço da série, de 0,68%, entre 2018 e 2019 — o movimento ganhou força a partir de 2020 e registrou o maior salto anual entre 2023 e 2024, quando a receita subiu 14,66%, passando de R$ 21,6 bilhões para R$ 24,8 bilhões.

Para este ano, apesar de não confirmar a expectativa de aumento na arrecadação, o Governo do Distrito Federal (GDF) avalia que não há risco de frustração da receita prevista na Lei Orçamentária de 2025, estimada em R$ 24,04 bilhões. O acumulado do ano também aponta superavit de R$ 1,6 bilhão até setembro, reforçando o cenário de estabilidade fiscal. No recorte mensal, setembro registrou arrecadação de R$ 2,1 bilhões, crescimento nominal de 2,6% em relação a setembro de 2024.

Valdo Virgo - CID-Arrecadação DF

Para César Bergo, membro do Conselho de Economia do DF e professor de Mercado Financeiros da Universidade de Brasília (UnB), o desempenho da arrecadação reflete um momento favorável da economia local. "Esses números são altamente positivos, sobretudo porque a arrecadação vem subindo acima da inflação. O setor de serviços tem sido decisivo para esse crescimento, impulsionado pelo turismo, pela renda do trabalhador e pelos reajustes concedidos ao funcionalismo em 2025, que ampliaram o consumo", afirmou. 

Para ele, a melhoria na fiscalização teve papel importante. "A eficiência arrecadatória aumentou. O GDF tem atuado de forma mais pontual na cobrança e no combate à sonegação, e isso se reflete diretamente nos resultados positivos", explicou. 

Os maiores incrementos reais vieram de impostos com mais peso na receita distrital: ISS ( R$ 170,4 milhões), IRRF ( R$ 93,3 milhões), ICMS ( R$ 80,1 milhões) e IPVA ( R$ 27,9 milhões). Entre as quedas de arrecadação, destacaram-se as Taxas (-R$ 163,5 milhões), o ITBI (-R$ 150,2 milhões) e o IPTU (-R$ 24,3 milhões), que puxaram parte do resultado para baixo.

De acordo com Bergo, a composição da arrecadação confirma o bom momento econômico da capital. "Os impostos que mais cresceram mostram a força do setor de serviços e também o aquecimento do mercado imobiliário. Brasília segue muito dependente dos serviços, mas essa característica é reforçada pelo grande número de servidores, que, ao terem aumento salarial, ampliam o consumo e, naturalmente, a arrecadação", detalhou. 

Ele avalia que o DF deve cumprir a meta prevista para 2025. "A tendência é de que a meta seja alcançada, não só pelo superavit, mas porque a atividade econômica permanece forte no fim do ano. Embora a taxa de juros alta afete o crescimento nacional e local, Brasília mantém o mercado de trabalho aquecido e se beneficia, também, do Fundo Constitucional, o que ajuda a sustentar o avanço das receitas", completou.

Cautela

Para o professor Marilson Dantas, pesquisador em Gestão, Custos e Governança Pública da UnB, o avanço da arrecadação deve ser lido com cuidado. "O Brasil tem uma carga tributária elevada, e o DF não é diferente. A sustentabilidade da arrecadação não pode depender apenas do aumento contínuo de receitas, mas do fomento ao crescimento econômico e do uso eficiente dos recursos públicos", destacou. 

Segundo ele, tributos como "Outros impostos" e o Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens (ITCD), embora tenham apresentado crescimentos expressivos de 13% e 9%, respectivamente, têm baixa representatividade no total arrecadado. "No caso do ITCD, parte do aumento pode estar ligada à expectativa de mudanças trazidas pela reforma tributária. Já o ISS e o Imposto de Renda têm relação mais direta com a atividade econômica, mas o aumento da arrecadação, sozinho, não significa sustentabilidade desse crescimento", alertou.

O professor assinalou que parte do desempenho positivo pode ser resultado de maior eficiência arrecadatória. "Melhorias na fiscalização promovem justiça tributária e equilibram o mercado, porém a percepção do contribuinte também depende da clareza sobre como os recursos são aplicados", avaliou. Ele acredita que o DF deve alcançar a meta projetada para 2025, mas o desafio está no médio e no longo prazos. "O panorama até o terceiro trimestre é bastante consolidado, mas o GDF precisa avançar na gestão e na governança das despesas. Só assim será possível construir um crescimento sustentável da arrecadação e da entrega de valor à sociedade", concluiu.

Fiscalização

A Secretaria de Economia do DF (SEEC) atribui o aumento da arrecadação tributária ao fortalecimento das ações de fiscalização e ao estímulo à regularização por meio de novos programas. Segundo o secretário-executivo da Fazenda do DF, Anderson Roepke, a ampliação da transação tributária para praticamente todos os tributos foi decisiva para o bom resultado. "Lançamos a transação tributária para tributos indiretos, como ICMS e ISS, e também para tributos diretos, como IPTU e IPVA. Isso ajudou bastante na regularização, sem a necessidade de aumentar alíquotas", comentou. 

O acordo permite a regularização de débitos fiscais inscritos em dívida ativa com condições especiais, como descontos em multas e juros, além de prazos estendidos para pagamento, visando facilitar a quitação de impostos como IPTU e ICMS para pessoas físicas e jurídicas.

Além dos incentivos ao contribuinte, o GDF passou a operar ferramentas tecnológicas que ampliaram a capacidade de fiscalização. De acordo com Roepke, o novo Sistema Eletrônico de Fiscalização de Mercadorias em Trânsito, em funcionamento desde setembro, aumentou significativamente a precisão das abordagens. "As câmeras de OCR (em português, reconhecimento ótico de caracteres) leem as placas dos caminhões, verificam se há nota fiscal e fazem a triagem automática de possíveis irregularidades. Hoje, quando abordamos um veículo, praticamente já temos certeza de que há alguma inconsistência", detalhou. Segundo ele, isso beneficia quem está regular, que deixa de ser parado desnecessariamente.

As medidas integradas de monitoramento — que incluem o novo sistema de verificação eletrônica dos créditos de ICMS declarados na escrituração fiscal — reforçaram, especialmente, a arrecadação do imposto, que é responsável por metade das receitas tributárias do DF. "O ICMS teve mais de R$110 milhões de incremento, resultado direto da melhoria na eficiência e no combate à sonegação", afirmou Roepke. 

Ele acrescentou que o ISS também apresentou crescimento e que o conjunto das ações "aumenta a conformidade, combate a sonegação e incrementa a arrecadação sem aumentar imposto", consolidando a estratégia da pasta para fortalecer as finanças públicas.

O tripé da arrecadação

O aumento na arrecadação do DF de janeiro a setembro de 2025 foi puxado, principalmente, por três tributos — ICMS, IR e ISS —, enquanto impostos ligados ao mercado imobiliário e receitas de taxas recuaram. O ICMS, maior fonte de receita do governo local, subiu 5,9%, de R$ 8,659 bilhões para R$ 9,170 bilhões, resultado do aumento do consumo, da arrecadação de combustíveis e energia e do fortalecimento das operações de fiscalização. O tributo respondeu por quase metade de tudo o que o DF arrecadou no período: 46,15%. 

Em seguida, aparece o Imposto de Renda, que passou de R$ 3,552 bilhões para R$ 3,887 bilhões, crescimento de 9,4% impulsionado pelo aumento da massa salarial dos servidores e pela expansão da base de repasses federais ao DF. O ISS, terceiro maior tributo, registrou o melhor desempenho entre as receitas de grande porte: saltou de R$ 2,528 bilhões para R$ 2,823 bilhões, alta de 11,7%, refletindo a expansão do setor.

Entre os impostos patrimoniais, o IPVA teve crescimento de 6,6%, alcançando R$ 1,781 bilhão, impulsionado pelo aumento da frota e pela melhoria na adimplência. O IPTU apresentou avanço de 3,1%, totalizando R$ 1,204 bilhão.

Já o mercado imobiliário mostrou desaceleração: o ITBI caiu 25,5% — de R$ 486 milhões para R$ 362 milhões — indicando queda nas escrituras e menor dinamismo nas transações de compra e venda.

As maiores quedas ocorreram nas receitas de taxas. As taxas tradicionais recuaram 28%, de R$ 485 milhões para R$ 349 milhões, enquanto as "outras taxas" despencaram 59%, de R$ 281 milhões para R$ 115 milhões, sugerindo revisão de cobranças, menor atividade regulada ou reclassificação contábil. Entre as receitas residuais, "outros impostos" cresceram de R$ 39 milhões para R$ 58 milhões, puxados por ações de recuperação de créditos e cobrança da dívida ativa.

 

Entenda as siglas:

IR: Imposto de Renda 

IPTU: Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana

IPVA: Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores

ITCD: Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos

ITBI: Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis

ICMS: Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços

ISS: Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza

TLP: Taxa de Longo Prazo

 

Arrecadação por imposto

2024 janeiro a setembro

ICMS: R$ 8,659 bilhões

IR: R$ 3,552 bilhões

ISS: R$ 2,528 bilhões

IPVA: R$ 1,670 bilhão

IPTU: R$ 1,168 bilhão

ITBI: R$ 486 milhões

ITCD: R$ 219 milhões

TAXAS: R$ 485 milhões

OUTRAS TAXAS: R$ 281 milhões

TLP: R$ 229 milhões

OUTROS IMPOSTOS*: R$ 39 milhões

TOTAL: R$ 18,811 bilhões

 

2025 janeiro a setembro

ICMS: R$ 9,170 bilhões

IR: R$ 3,887 bilhões

ISS: R$ 2,823 bilhões

IPVA: R$ 1,781 bilhão

IPTU: R$ 1,204 bilhão

TAXAS: R$ 349 milhões

ITBI: R$ 362 milhões

TLP: R$ 233 milhões

ITCD: R$ 230 milhões

OUTRAS TAXAS: R$ 115 milhões

OUTROS IMPOSTOS*: R$ 58 milhões

TOTAL: R$ 19,867 bilhões

*Multas e juros e dívida ativa de origem tributária não consideradas em itens anteriores.

Fonte: Secretaria de Economia do DF

 

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