No dia em que prestará depoimento à Polícia Federal (PF), o ex-presidente do Banco de Brasília (BRB), Paulo Henrique Costa, chega, mais uma vez, ao centro das atenções com a promessa de esclarecer seu papel em uma das maiores crises recentes envolvendo o banco público do Distrito Federal.
A oitiva está marcada para hoje, às 14h, na Superintendência da PF em Brasília, e deve detalhar a atuação do ex-dirigente nas operações de compra de carteiras de crédito falsas emitidas pelo Banco Master. Enquanto isso, empossado na presidência do BRB, Nelson Antônio de Souza se prepara para retomar os trabalhos na instituição.
O advogado de Paulo Henrique Costa, Cleber Lopes, afirmou que o depoimento terá "importância muito grande" para o avanço da investigação e para o esclarecimento definitivo dos fatos. Segundo ele, o ex-presidente do BRB está "convencido de que prestará todos os esclarecimentos necessários" e mantém total segurança de que não cometeu qualquer ilegalidade.
Lopes reforçou que a compra das carteiras de crédito do Banco Master seguiu critérios de mercado, respeitou as diretrizes de governança da instituição e fazia parte de um planejamento estratégico aprovado em 2021. "Não foi nenhuma aventura. Foi uma operação baseada em parâmetros técnicos do sistema financeiro", declarou.
Ele destacou, ainda, que não houve prejuízo ao BRB decorrente das operações investigadas e lembrou que o próprio banco, em nota pública, afirmou não ter identificado perda patrimonial relacionada às transações com o Banco Master.
A ida de Paulo Henrique à PF foi confirmada após Lopes comparecer, na semana passada, à sede da corporação para entregar o passaporte, um celular iPhone e um computador pertencentes ao ex-presidente — todos desbloqueados — em cumprimento às ordens judiciais da Operação Compliance Zero.
A diligência foi revelada pela jornalista Ana Maria Campos, no CB.Poder, do Correio. A medida foi considerada pela defesa como "demonstração de que o Paulo Henrique não tem nada a esconder e está disposto a colaborar com as investigações".
Desgaste
O depoimento desta segunda-feira ocorre num contexto de BRB ainda abalado pelos desdobramentos da Operação Compliance Zero (Veja linha do tempo), realizada pela Polícia Federal. A ação investiga um esquema de fraudes envolvendo a emissão e negociação de carteiras de crédito inexistentes produzidas pelo Banco Master. O controlador do Master, Daniel Vorcaro, foi preso e tornou-se um dos principais alvos do inquérito. Na noite de sexta-feira, Vorcaro foi liberado pela desembargadora Solange Salgado da Silva, do Tribunal Regiona Federal da 1ª Região (TRF1), mas permanece monitorado por meio de tornozeleira eletrônica.
As investigações atingiram diretamente o BRB após a revelação de que o banco público adquiriu R$ 12,2 bilhões em títulos sem lastro provenientes do Master. A operação foi classificada pelo Banco Central (BC) como "temerária" e acendeu alerta máximo na autoridade monetária.
A situação se agravou com a descoberta de tentativas do BRB, ainda no início deste ano, de comprar o controle acionário do Banco Master por cerca de R$ 2 bilhões. O negócio, que chegou a avançar, foi barrado pelo BC em setembro por risco de incorporar ativos problemáticos capazes de comprometer a saúde financeira do banco brasiliense.
Com o veto, o Banco Central encaminhou documentos ao Ministério Público Federal (MPF), que, por sua vez, acionou a PF para aprofundar as investigações — movimento que culminou na operação policial e na crise atual. A Justiça Federal determinou o afastamento de Paulo Henrique do comando do BRB por 60 dias. Na data da deflagração da Operação Compliance Zero, ele foi demitido pelo governador Ibaneis Rocha (MDB).
Próximos passos
O caso desencadeou uma ampla auditoria determinada pelo Banco Central, que terá 20 dias para concluir o exame das operações realizadas pelo BRB em 2025 e 60 dias para revisar transações de 2024. A inspeção deve analisar especialmente operações com indícios de fraude envolvendo o Banco Master, ativos oferecidos como garantia e demais procedimentos que levantem suspeitas. Os resultados poderão ampliar o escopo de responsabilizações tanto na esfera administrativa quanto civil.
O BRB e o Banco Central foram notificados a cumprir imediatamente as determinações judiciais, e as provas recolhidas pela PF serão compartilhadas com o MPF e com o Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT). A expectativa é de que os órgãos definam, a partir das conclusões da operação, se proporão novas ações de responsabilização.
O Banco de Brasília também anunciou que solicitará à Justiça autorização para atuar como assistente de acusação no processo relacionado à operação com o banco Master, após deliberação e aprovação pelo Conselho de Administração (Consad).
Além disso, a instituição financeira havia informado, em comunicado à imprensa, que "todo o processo de substituição de carteiras e adição de garantias, prática prevista em contrato, foi reportado e acompanhado pelo Banco Central". O banco público do DF também garantiu que as carteiras atuais seguem o padrão adequado e que segue colaborando com as autoridades.
Sucessão
Em meio a tamanha turbulência, Nelson Antônio de Souza, já começou a trabalhar. O executivo teve seu nome aprovado pela Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) na terça-feira (25/11) e recebeu aval do Banco Central no dia seguinte, consolidando a chegada dele ao comando da instituição.
A posse oficial ocorreu na sede do BRB, conduzida pelo presidente do Conselho de Administração, Marcelo Talarico, e foi seguida, na quinta-feira, por um ato simbólico no Palácio do Buriti, no qual o governador Ibaneis Rocha, sem presença da imprensa, reafirmou o apoio político e institucional ao novo dirigente.
Ao comentar sua chegada, Ibaneis ressaltou a experiência acumulada por Nelson ao longo de mais de quatro décadas no setor financeiro e lembrou seu papel em momentos estratégicos da Caixa Econômica Federal e do Banco do Nordeste.
Nelson, por sua vez, agradeceu a confiança e destacou que chega com a missão de fortalecer pilares como governança, gestão de pessoas e resultados. Reafirmou ainda o compromisso de atuar junto aos mais de 5 mil empregados do BRB para manter o ritmo de crescimento sem comprometer padrões de integridade. "Temos consciência do papel de um banco público querido pelo povo de Brasília e região", afirmou.
Caixa Econômica
Além de encarar a Polícia Federal, Paulo Henrique Costa terá que lidar com a Caixa Econômica Federal ingressou com uma ação na Justiça Federal de Brasília para cobrar uma dívida de R$ 131 mil dele. A informação foi revelada pela Veja. De acordo com o processo, a dívida se refere a gastos acumulados no cartão de crédito pessoal do ex-dirigente, que não foram quitados apesar das tentativas de cobrança extrajudicial feitas. Diante da ausência de pagamento, o banco solicitou à Justiça que determine buscas em bases de dados públicas e órgãos federais, como a Receita Federal e o Banco Central, para garantir sua localização caso ele não seja encontrado no endereço informado.
Apesar da simultaneidade em relação aos fatos envolvendo o Banco Master, a dívida cobrada pela Caixa não tem relação com as transações sob investigação. Ela diz respeito exclusivamente a débitos pessoais do ex-presidente, que também é alvo de outra ação judicial: em 2023, o Opportunity Fundo de Investimento Imobiliário processou Paulo Henrique por uma dívida de R$ 49 mil. O negócio, entretanto, não avançou, já que o ex-dirigente contestou os valores.
