MÚSICA

Canto da alma portuguesa: Carminho celebra centenário de Carlos Paredes com show

Como parte da programação do Festival Fado, lusitana desembarca em Brasília para show único na próxima quarta-feira (26/11)

Portuguesa sempre escutou musica brasileira -  (crédito: Mariana Maltoni)
Portuguesa sempre escutou musica brasileira - (crédito: Mariana Maltoni)

Com composições românticas que carregam fortes influências da música brasileira e do fado, estilo musical português marcado pelo uso das guitarras portuguesa e clássica e por letras que falam de amor, Carminho é uma das vozes lusitanas mais proeminentes da atualidade. A cantora, que já colaborou com diversos artistas nacionais e internacionais, vem para o Brasil promover o disco Eu vou morrer de amor ou resistir com show no Centro de Convenções Ulysses Guimarães, na próxima quarta-feira (26/11), às 20h.

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O show da cantora integra a programação da 15ª edição do Festival Fado e, ao mesmo tempo, homenageia o centenário do músico Carlos Paredes. Além de Carminho, o festival inclui um tributo ao músico, realizado pelos guitarristas André Dias e Hugo Gamboias; uma exposição sobre a história pessoal e profissional do artista; uma palestra na UnB e a exibição de um filme de Edgar Pêra. A programação completa pode ser conferida no site festivalfadobrasilia.com. 

Três perguntas para Carminho, cantora:

Você tem colaborações com diversos cantores brasileiros, como Marisa Monte, Chico Buarque e Caetano Veloso, além de ter gravado o álbum Carminho canta Tom Jobim, a convite da família do artista. De que maneira a música e os artistas brasileiros inspiram a sua arte?

A música brasileira está presente na minha vida desde sempre, porque eu assistia às novelas que chegavam a Portugal, e com elas vinham muitas músicas brasileiras e muitos artistas que eu fui conhecendo, com o tempo, fora das novelas também. Com 7 ou 8 anos, aprendi que eles tinham a própria carreira e discos. Foi muito revelador para mim, muito importante, porque comecei a ouvir Tom Jobim, Chico Buarque, Vinícius de Moraes, Nana Caymmi, todos esses artistas que aprendemos a ouvir em casa, com os pais ou irmãos, e que continuam com a gente pelo resto da vida. Mais tarde, quando eu tive a oportunidade de iniciar a minha carreira e lançar meus discos no Brasil também, foi uma revolução na minha vida. A ideia de colaborar e aprender com estes artistas é algo  inexplicável. Quer dizer, eu nem consigo falar muito sobre isso, porque cada um é muito especial, e cada um deles me deu muito de si, pessoalmente e artisticamente, e eu aprendi muito como pessoa.

O disco que eu fiz sobre o Tom Jobim, inclusive tenho muita saudade do Paulinho Jobim e de toda a equipe com quem eu trabalhei, é um disco que me abriu um horizonte musical. Porque para além da convivência com estes artistas e da forma como eles são generosos e abertos às novas gerações, eles partilham, colaboram e dividem todas essas formas de estar na música que são muito inspiradoras. Abordar os temas de Tom Jobim também me fez sair da minha zona de conforto e crescer como intérprete, o que me levou a acrescentar novos conceitos no disco seguinte que produzi, Maria, que ainda não sentia a necessidade de incluir antes.

Comecei a praticar o fado na barriga da minha mãe, e de alguma maneira ser fadista era algo natural, orgânico e bastante gratificante e compensador para mim. Eu continuo praticando, mas hoje é sobre pensar no processo, no próprio fado como gênero, no que ele me oferece, ou como eu posso utilizá-lo para me expressar. Encaro cada vez mais o fado como um instrumento dos meus pensamentos e das minhas emoções, e também aproveito para mesclar minhas referências e entregar algo novo para o público de hoje, para continuar mantendo o ritmo vivo. Ir ao Brasil e voltar a abrir muito o meu horizonte, me faz lidar com artistas e filosofias totalmente distintas e viver a colaboratividade e generosidade que vocês dão uns aos outros me fez aprender muito, sem dúvida.

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As canções do disco Eu vou morrer de amor ou resistir, o lançamento mais recente, têm as principais características do fado: a melancolia, o destino e a dramaticidade de morrer de amor. Como foi o processo de produção do álbum?

O processo de criação não nasce para um disco, pelo menos no meu caso, é um processo bastante contínuo. Venho com ideias desde meu último disco, Maria, de reflexões que exploram o fado de alguma maneira, como gênero musical, não só a parte formal dos instrumentos que o compõem mas também como eles servem para o fado e o fadista, qual é o papel da voz e da poesia, e que tipo de temática e lírica que é a tratada nos fados. Como ele foi evoluindo ao longo do tempo? Como é que podemos contribuir com novas composições sem perder as origens e características do cancioneiro do fado tradicional?

Todos esses assuntos me interessam dentro e fora do estúdio. A experimentação com o som e os instrumentos e refletir sobre o papel que esses instrumentos têm no serviço de cada fadista, me fazem chegar a diversas conclusões, e este disco em particular, o Eu Vou Morrer de Amor ou Resistir, trata muito sobre a voz. A voz é um lugar bastante central, mas não só a voz que se afirma como solista, como intérprete principal, como frente de um show, mas também aquela que se funde no resto dos intérpretes, dos músicos que tem suas dúvidas, que nem sempre está tão segura, e as múltiplas vozes que existem dentro de uma mulher.

A grande inspiração do álbum é também a mulher como artista, como criadora, como intérprete vulnerável, que tem várias vozes que soam e ressoam dentro, às vezes, em um conflito e em uma ambiguidade grande, mas que no fim têm que conviver e coexistir. Por isso, surgiram muitos instrumentos que vêm responder a essas questões: a utilização do vocoder e do mellotron com as minhas próprias vozes, por exemplo. Existe muito dessa dimensionalidade das vozes, em que eu canto comigo mesma, e a exploração das dimensões poética e formal delas, do ponto de vista do estúdio, estão presentes no disco.

O Festival está celebrando o centenário de Carlos Paredes, precursor da guitarra portuguesa e considerado um dos maiores símbolos da cultura lusitana. De que forma a música dele influenciou o fado e as suas composições? 

Carlos Paredes foi um grande músico, intérprete e compositor. Era muito experimental, no sentido em que utilizou a guitarra portuguesa de Coimbra à sua forma, à sua maneira, à sua medida e criou o seu próprio som, universo e composições a partir disso. Ele percebeu claramente que era essa a exploração que lhe interessava, que era também um instrumento da sua forma de fazer música. Então, acho que é uma grande inspiração para qualquer artista, não é? Como compositor, como homem de grandes convicções que não tinha medo de se afirmar e de cantar temas e problemáticas do seu tempo.

Ele foi um homem muito importante por gerações e continua sendo um símbolo de várias ideologias e formas de pensar, e acho que mais do que tudo, eu tenho a música dele presente como algo muito familiar. As canções e melodias me inspiram desde pequenina, e sinto que o Carlos Paredes é um um músico à parte também de vários outros músicos que o Fado teve, que compuseram muitos fados e que acompanhavam outros artistas. Ele acompanhava a si próprio, era um artista solo, e isso lhe trouxe também uma força e uma singularidade que fazem dele o grande artista que é.

*Estagiária sob a supervisão de Severino Francisco

Ficha técnica:

Carminho - Festival Fado 

Dia 26 de novembro, a partir das 20h, no Centro de Convenções Ulysses Guimarães. Ingressos a partir de R$ 100 + taxas do Ingresso Digital.

 

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postado em 23/11/2025 06:00
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