
O primeiro fim de semana do Cena Contemporânea tem um cardápio de espetáculos com as mais variadas temáticas, com direito a comédias clownescas recheadas de dramas shakespearianos e outros clássicos. Confira algumas das peças que estão em cartaz de hoje até domingo como parte do festival, que este ano completa três décadas e traz uma curadoria mais voltada para a América Latina.
Shakespeare cheio de moral
Para o ator argentino Gabriel Chamé, juntar Shakespeare e palhaçaria é uma coisa muito natural. "Shakespeare trabalhava diretamente com palhaços, os humoristas que estavam presentes em todas as peças. Trabalhava tanto a tragédia quanto o humor, porque o público também ria nos momentos trágicos. Ele era um artista muito comercial, não eram quatro horas de espetáculo sério e entediante: havia muito entretenimento, com tensão dramática e também comédia", explica o argentino, que traz para o Cena Contemporânea uma versão clownesca de Medida por medida.
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Na peça escrita pelo bardo no século 17, um duque déspota se disfarça para observar um deputado puritano enquanto governa. De olho também nos cidadãos, o duque acompanha o deterioramento da moral do puritano, que condena um homem à morte para poder seduzir sua irmã, uma freira. "No caso de Medida por medida, me parece muito interessante a contradição entre uma moral muito rígida e, ao mesmo tempo, algo que ressoa muito no presente, em que tudo é cínico", explica Chamé. "Com o que aconteceu com Bolsonaro, e agora com todas as contradições do período Lula, a peça ganha uma ressonância política muito forte."
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Para o ator, o desafio de fazer Shakespeare com dramaturgia de clown está em equilibrar certos aspectos do texto com o trabalho físico. E neste caso, como se trata de uma comédia, ele até reduziu o texto. "Porque, como faço muito clown, não preciso acrescentar cômicos. Nesta peça, há pelo menos seis personagens cômicos. O complicado é desenvolver um gag físico enquanto se diz o texto de Shakespeare. Isso é muito complexo", diz Chamé. "Ou seja: criar um registro chaplinesco, onde a linguagem física e o gag visual — que são muito importantes no meu trabalho — se unam à poética verbal de Shakespeare e à narração de uma história."
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De qualquer forma, para o argentino, viver os personagens do dramaturgo inglês é um presente para um palhaço porque as histórias são muito claras e as ações, muito simples. "E isso permite aprofundar o que realmente se quer contar", diz Chamé.
Serviço
Medida por medida (La culpa es tuya)
Com Gabriel Chamé Buendia (Argentina). Hoje e amanhã, às 20h30, na Sala Martins Penna (TNCS)
Diversão e Arte
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