Contas públicas

Governo turbina emissões de títulos públicos

Em ano pré-eleitoral, Tesouro abastece o caixa, mesmo a um custo elevado. Para especialista, a dívida contratada agora será um problema para os próximos governos

Ao detalhar o relatório, Daniel Leal, subsecretário da Dívida Pública do Tesouro, garantiu que o governo
Ao detalhar o relatório, Daniel Leal, subsecretário da Dívida Pública do Tesouro, garantiu que o governo "não pretende mirar o teto" - (crédito: Diogo Zacarias)

O Tesouro Nacional acionou o modo turbo de emissões de títulos públicos, a fim de engordar as reservas em caixa para o próximo ano, antecipando a volatilidade de um novo ano eleitoral — quando, tradicionalmente, os gastos aumentam de forma expressiva. Só que, de acordo com o economista-chefe da Equador Investimentos, Eduardo Velho, o volume dessas emissões é elevado e os juros pagos também — de mais de 7% acima da inflação —, o que é bom para os credores da dívida pública, mas péssimo para o contribuinte, que arcará com esse custo da União no futuro.

"O mercado ainda não está olhando isso como problema agora, porque não haverá risco de liquidez no próximo ano para o pagamento dos títulos que forem vencendo nos próximos meses. Mas, o custo dessa dívida contratada é muito alto e será um problema para os próximos governos", alertou Eduardo Velho, em entrevista ao Correio.

PAF

Na terça-feira, o Tesouro anunciou uma mudança no Plano Anual de Financiamento (PAF) da Dívida Pública Federal (DPF). Os limites do estoque da DPF previstos para este ano passaram de um piso de R$ 8,1 trilhões e um teto de R$ 8,5 trilhões, para R$ 8,5 trilhões a R$ 8,8 trilhões, respectivamente.

Essa mudança reflete o forte avanço do endividamento público que vem pagando juros, em média, de 11,65% ao ano. Em agosto, o estoque total da DPF ultrapassou o piso ao somar R$ 8,14 trilhões, dado 11,3% superior aos dados de dezembro de 2024. Com isso, no acumulado do ano, o estoque da DPF já cresceu R$ 828,9 bilhões.

Técnicos da Fazenda tentaram minimizar a mudança no PAF. No anúncio dos novos limites, Daniel Leal, o subsecretário da Dívida Pública do Tesouro, afirmou que os novos limites refletem "um ambiente mais saudável de emissão" e garantiu que o governo "não pretende mirar o teto". Contudo, nem todos acreditam nesse discurso. "Qualquer governo, quando muda a meta do PAF, acaba buscando o teto do estoque", afirmou Velho.

O economista lembrou que o próprio governo já sinalizou que deve ampliar o colchão de liquidez para algo entre oito a nove meses — acima do dado de agosto, de 7,7 meses, e, inevitavelmente, as novas emissões devem fazer o estoque bater o limite superior do PAF.

O colchão de liquidez é uma reserva no caixa do Tesouro para cobrir os títulos que vencem no curto prazo, ou seja, em até 12 meses. Em agosto, esses recursos cresceram quase 15% na comparação com julho, passando para R$ 1,1 trilhão.

"Um juro real acima de 7% é muito alto em um cenário que se espera uma inflação mais baixa", afirmou. Na avaliação dele, para fazer frente às novas taxas de juros que os títulos públicos estão pagando nos prazos mais longos, o governo vai ter que apresentar um forte crescimento no Produto Interno Bruto (PIB) e entregar um superavit primário (economia para o pagamento dos juros da dívida pública) bem robusto.

Metas

Mas as emissões não estão ocorrendo apenas no interno para ampliar essas reservas e pagando juros acima de 7%. No início de setembro, o Tesouro realizou uma emissão externa com dois tipos de papel — um de cinco anos e outro de 30 anos de vencimento. Foram emitidos, por exemplo, US$ 2,5 bilhões do Global 2056, título com pagamento de cupom de juros de 7,25% ao ano, que somado com o desconto no preço do valor de face equivale a um retorno de 7,5% anuais. 

O consenso entre especialistas em contas públicas é de que o governo vai demorar ainda vários anos para conseguir colocar as contas públicas no azul novamente. Neste ano, por exemplo, a equipe econômica segue mirando o piso da meta fiscal deste ano — que permite um rombo de até R$ 31 bilhões — e levou um puxão de orelha do Tribunal de Contas da União (TCU) para focar no centro da meta, de deficit zero. E, para piorar, a meta fiscal só deverá ser cumprida no papel, graças aos descontos de despesas, como precatórios e gastos emergenciais, como aconteceu em 2024.

 


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postado em 02/10/2025 04:38
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