
Recentemente, um vídeo de uma mulher que reproduzia uma trend de supermercado viralizou nas redes sociais, alcançando mais de 8 milhões de visualizações. O motivo do sucesso, no entanto, não foi pelo conteúdo em si, mas sim por uma tatuagem de borboleta que a criadora do vídeo exibia.
Os comentários da produção alegavam que a escolha do desenho revelava uma mulher problemática e red flag — sinais de alerta que representam complicações. O “nômade digital” Raiam Santos foi um dos principais precursores da opinião, afirmando que a tatuagem é um sinal de mulher rebelde e emocionalmente instável.
Gabriela Augusto, consultora, palestrante e fundadora da Transcendemos, avaliou a situação como uma vigilância moral sob o corpo feminino. “Isso é red pill em ação, o movimento que cria códigos para julgar e controlar mulheres”, afirmou em publicação no Instagram. “Mulheres tatuadas são vistas como mais promíscuas e menos confiáveis, mesmo sem nenhuma evidência disso.”
Os internautas divergiram. Alguns consideram a tatuagem um sinal de uma pessoa sem valor, enquanto outros endossaram o machismo.
Para Lucas Brito, mestre em política social, doutorando em sociologia e professor da UnB, vários elementos relacionados ao corpo feminino foram alvos de ódio, violência e discriminação ao longo do tempo. “Já houve momentos em que cabelo curto era um símbolo de pouca predisposição e sexualização”, exemplifica.
Tais simbolismos — desde o comprimento de uma saia ou o uso de calças, até a tatuagem — indicam uma quebra de expectativa de uma sociedade machista e patriarcal, conforme o sociólogo. Quando mulheres se apropriam de elementos originalmente destinados a homens, a hierarquia é contrariada.
“Cria-se um movimento de massa, quando pessoas deixam de atuar individualmente e passam a atuar como um grupo”, explica Lucas sobre os diversos comentários de repulsa à tatuagem. “Nesse aspecto, é um comportamento turvo, que é quando o movimento gira em torno de elementos irracionais. Ou seja, não tem uma profundidade e nem relação com a realidade, mas está baseado na idealização de um grupo social.”
Impactos do ódio digital
Segundo Fabrício Lemos Guimarães, doutor em psicologia, professor da Universidade de Brasília (UnB) e pós-graduado em impactos da violência na saúde, os ataques digitais são extremamente danosos para a saúde mental — especialmente para as mulheres.
O especialista cita um conceito chamado tecnologia de gênero, que define como as violências contra as mulheres se moldam conforme os momentos históricos. “Nesse último momento digital, tem uma repercussão muito mais ampla. Às vezes, os homens escolhem determinadas linguagens e símbolos, e a mulher não sabe de onde está vindo o ataque”, disserta.
Por meio das redes sociais, agressores muitas vezes se portam como um provedor de sabedoria, conforme Guimarães. “Não tem como definir uma mulher por uma tatuagem”, resume. “Antigamente, até era um símbolo de crime ou promiscuidade. Hoje, é preconceito.”
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