Mesmo diante de pressões para adiar a votação, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), manteve para esta quarta-feira a análise do Projeto de Lei (PL) da Dosimetria no plenário da Casa. A proposta, aprovada pela Câmara dos Deputados, ainda precisa passar pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), onde há forte resistência e possibilidade de pedido de vista, o que pode empurrar a discussão para 2026.
O avanço do projeto tem provocado desconforto entre senadores de diferentes partidos, que evitam associar seus nomes a um texto visto como sensível do ponto de vista político. A avaliação é de que a proposta pode beneficiar condenados por crimes que extrapolam os atos golpistas de 8 de Janeiro, ampliando seus efeitos para outros tipos penais.
Nesta segunda-feira, o relator do projeto no Senado, Esperidião Amin (PP-SC), disse que o texto, da forma que está, não tem apoio suficiente para ser aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). A declaração dele vai ao encontro do que disse o presidente do colegiado, Otto Alencar (PSD-BA).
"Infelizmente, o texto que veio da Câmara, teoricamente para reduzir o tempo da Débora do Batom ou de Bolsonaro, abrange outros tipos penais, desde corrupção até exploração sexual", ressaltou Amin, em entrevista à GloboNews. "Isso não vai passar. Não é apenas o senador Otto Alencar, eu tenho certeza de que nenhum outro senador declarará o seu voto a favor (disso)", acrescentou o catarinense.
Amin disse ver três alternativas para o texto que chegou da Câmara. Segundo ele, é possível salvar o PL "com um grande acordo"; modificá-lo para retirar as brechas que podem beneficiar corruptos e criminosos; ou sepultá-lo e substituí-lo por um novo projeto no Senado, "que pode ser de dosimetria ou de anistia" — conforme enfatizou.
Ele está em conversas, desde a semana passada, com o senador Alessandro Vieira (MDB-SE), relator do PL Antifacção na Casa, para tentar tapar os buracos do texto relatado pelo deputado federal Paulinho da Força (Solidariedade-SP).
Isso porque o PL da Dosimetria, além de reduzir as penas e o tempo de prisão em regime fechado para beneficiar os bolsonaristas pegos nos ataques do 8 de Janeiro e o ex-presidente Jair Bolsonaro, vai na contramão do PL Antifacção aprovado no Senado. Trechos dos dois projetos são incompatíveis e conflitantes.
O governo Lula avalia que o PL beneficia com um porcentual de progressão mais generoso crimes graves como aqueles contra a administração pública, incolumidade pública (incêndio, explosão), contra a saúde pública, contra a fé pública (falsidade ideológica, de documento público) e os crimes contra o Estado Democrático de Direito.
Também pode abrandar penas de crimes como violação sexual mediante fraude, importunação sexual e corrupção de menores, por exemplo, uma vez que não são crimes hediondos e não estão cobertos pela exceção criada no PL da Dosimetria.
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Os senadores não têm ainda uma solução para salvar o projeto e evitar uma modificação drástica o bastante que o devolva para apreciação na Câmara. Amin define como "um desafio à criatividade" retirar os jabutis pró-criminosos sem que o texto volte à outra Casa.
Vieira pretende apresentar um voto em separado, segundo Amin, para corrigir o favorecimento a crimes diversos daqueles relativos ao 8 de Janeiro, o que pode atrasar a tramitação no Congresso.
"Existe essa possibilidade (de começar originalmente um projeto no Senado). A iniciativa do senador Vieira, se for aprovada, vai resultar no encerramento do projeto que veio da Câmara e no início do projeto que teria como base o seu voto em separado, com as alterações que forem aprovadas. Esse seria o projeto que iria para a Câmara. O Senado passaria a ser o iniciador, e a Câmara passaria a ser o órgão revisor", destacou.
Amin é favorável à anistia para os golpistas, mas disse que sua missão é "procurar aprovar o que veio da Câmara de acordo com o que se enuncia, que é se propiciar uma redução de penas que seria imediatamente aplicável".
Pressão
O senador Omar Aziz (PSD-AM) afirmou que a comissão fará uma análise técnica do texto. Ele rechaçou a ideia de legislar em favor de indivíduos específicos. "Não podemos fazer uma lei para uma pessoa, iremos analisar e, se for bom, passará; se não, não", declarou, ao comentar a pressão em torno da matéria.
O PL da Dosimetria altera as regras de progressão de regime, permitindo que condenados com bom comportamento avancem do regime fechado para o semiaberto ou aberto após o cumprimento de um sexto da pena, e não mais de um quarto.
Outro ponto central do texto é o fim da soma de penas para crimes contra o Estado Democrático de Direito, como tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Com isso, passaria a valer somente a pena mais alta prevista, o que pode reduzir significativamente o tempo de prisão de condenados por esses crimes, incluindo Bolsonaro, sentenciado pela Primeira Turma do STF a 27 anos de prisão por tentativa de golpe de Estado e outros crimes.
Apesar das críticas, apoiadores do projeto demonstram confiança na aprovação. A senadora Damares Alves (Republicanos-DF) afirmou haver maioria para avalizá-lo. "Temos o Centrão do nosso lado, será aprovado. O nosso 'medo' será a sanção, mas acredito que, talvez, o presidente Lula pense na possibilidade da prisão humanitária", frisou.
No fim de semana, ocorreram manifestações contra o PL da Dosimetria em diversas capitais, organizadas pelas frentes Povo Sem Medo e Brasil Popular, com participação de movimentos como MST e MTST.
Sob o lema "Congresso Inimigo do Povo", os protestos criticaram o que classificam como tentativa de reduzir penas de envolvidos nos atos antidemocráticos e pressionaram o Senado a barrar a proposta. (Com Agência Estado)
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