ECONOMIA

Agricultores do DF adotam práticas sustentáveis e mostram produção em harmonia com o Cerrado

Agricultores do DF mostram que é possível produzir com sustentabilidade e em harmonia com o meio ambiente. De acordo com a Emater-DF, 2.188 propriedades rurais adotam práticas ecológicas e de proteção do bioma

Luiz Carlos:
Luiz Carlos: "O objetivo é não mexer com veneno, mas sim plantar muitas árvores para proteger o terreno cuida da terra e produzir de forma responsável" - (crédito: Fotos: Bruna Gaston CB/DA Press)

Produtores rurais do Distrito Federal têm reforçado o compromisso com práticas mais sustentáveis, em sintonia com a natureza e o equilíbrio ambiental. No Cerrado, brotam iniciativas que unem produção e preservação. Quando a agricultura se une com o bioma, nasce uma parceria que valoriza a terra, protege a biodiversidade e inspira um futuro mais verde. Enquanto ocorre a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), em Belém, o DF oferece exemplos de quais caminhos a agricultura pode tomar, respeitando e se alinhando ao meio ambiente.

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É o caso de Luiz Carlos Feitosa, de 60 anos, agricultor familiar simples, morador de São Sebastião, que cultiva uma pequena propriedade com o apoio da Emater-DF. Ele afirma que apenas tenta fazer o que considera certo: cuidar da terra e produzir de forma responsável. "O objetivo é não mexer com veneno, mas, sim, plantar muitas árvores para proteger o terreno. Essas são algumas práticas que a Emater-DF indicou, e eu procuro sempre melhorar meu sistema de agrofloresta", contou.

Luiz Carlos encontrou na agrofloresta um caminho sustentável para garantir renda e preservar o meio ambiente. O sistema, que combina árvores e culturas agrícolas na mesma área, promove equilíbrio e fertilidade natural. "Tenho baru, acerola, todas as frutas no meu terreno. É uma composição em que planto tudo junto — árvores e frutas. Tudo se transforma em mata ciliar. Fazemos compostagem e, com isso, sentimos que a qualidade da terra está melhorando, e a nossa qualidade de vida também. Respiramos muito melhor aqui".

A agrofloresta implantada por Luiz Carlos recupera o solo, reduz o uso de água e adubos, e estimula o retorno da biodiversidade. Além de cultivar uma floresta de baru, árvore símbolo do Cerrado, ele também faz reciclagem e compostagem, fechando o ciclo de aproveitamento dos recursos naturais. "A qualidade dos alimentos é muito boa, e sem a preocupação de haver veneno. Não é em muitos lugares que você pode ter essa tranquilidade de estar comendo algo natural. Aqui, a gente sente que tudo vem da terra de forma limpa, e isso faz diferença na vida da gente", ressaltou Luiz Carlos, que segue cultivando, com simplicidade e consciência.

  • Prática de reciclagem e compostagem gera mudanças no solo no projeto de agrofloresta
    Prática de reciclagem e compostagem gera mudanças no solo no projeto de agrofloresta Bruna Gaston CB/DA Press
  • Pelo modelo autossustentável, há uma relação harmoniosa entre a produção e o bioma
    Pelo modelo autossustentável, há uma relação harmoniosa entre a produção e o bioma Bruna Gaston CB/DA Press
  • Produção de bioinsumos na Fazenda Malunga: qualidade da terra e dos produtos
    Produção de bioinsumos na Fazenda Malunga: qualidade da terra e dos produtos Arquivo pessoal
  • Joe Valle faz uma produção orgânica
    Joe Valle faz uma produção orgânica Arquivo pessoal

Olhar orgânico

Atualmente, o DF tem 2.188 propriedades rurais que adotam práticas ecológicas ou possuem certificação orgânica, segundo o agrônomo da Emater-DF, Daniel Rodrigues. Ele destacou o crescimento das práticas sustentáveis e o avanço da agricultura orgânica entre os pequenos produtores. "A responsabilidade está aumentando no DF. É um processo mundial. Estamos vendo como trabalhar alinhado com a biologia traz benefícios. O Brasil é, hoje, o país que mais utiliza bioinsumos no mundo".

Segundo ele, o número de agricultores orgânicos tem crescido de forma expressiva nos últimos anos. "Estamos aumentando esse modelo. Este ano, são 388 produtores, enquanto no início do ano passado tínhamos cerca de 230. A maioria é formada por assentados, e o cultivo orgânico tem sido uma porta de entrada para eles no mercado, permitindo produzir e vender alimentos saudáveis com sustentabilidade e dignidade", disse Daniel.

Grande produtor

Um exemplo de harmonia entre produção e natureza é o produtor rural e proprietário da Fazenda Malunga, no PAD-DF, Joe Valle, um dos pioneiros da agricultura orgânica no Cerrado. Ele e a esposa começaram quando o termo "agricultura alternativa" ainda era novidade. Hoje, a Malunga é reconhecida como uma das principais referências em produção sustentável no Cerrado. "Nós desenvolvemos, ao longo dos anos, um método de corredores agroecológicos que ligam matas. Respeitamos a diversidade abrindo clareiras produtivas, voltando aos processos da mata e mantendo o equilíbrio natural. Dentro desse ambiente, os insetos controlam outros insetos, é o que chamamos de biocontrole. Esse sistema permite alta produtividade preservando a biodiversidade".

O produtor destaca que a estrutura da fazenda foi pensada para integrar produção e conservação. "Há sempre corredores equidistantes, com vegetação nativa, para que esses insetos possam sobreviver e continuar desempenhando seu papel no equilíbrio ecológico. E, claro, a preservação da mata, garantindo que tenhamos uma condição de equilíbrio na produção", reforçou.

Segundo ele, a base da produção orgânica é o tripé da sustentabilidade. "Temos um tripé na produção orgânica que respeita toda a diversidade da vida: o uso de microorganismos no solo vivo, os pós de rocha, que são remineralizadores e devolvem nutrientes aos solos antigos e desgastados do Planalto Central, e as plantas de cobertura. Esse tripé é o destaque da nossa produção para ter um ambiente bem controlado e organizado", explicou o produtor.

Joe Valle ressaltou que a fazenda é um exemplo de que é possível produzir sem agredir o meio ambiente. "A gente tem trabalhado no processo de não utilização de agricultura de agrotóxicos, nada de defensivos químicos. Preservamos todas as matas e criamos barreiras naturais contra o vento. Com isso, temos observado o retorno da fauna nativa, que volta a circular entre as matas e as barreiras vivas, ajudando na regeneração do Cerrado. Estamos há 38 anos produzindo no mesmo local, ampliando áreas de vegetação e aumentando a produtividade sem desmatar. Isso prova que é possível ser ambientalmente correto, socialmente justo e economicamente viável".

Projetos

O projeto Sementes do Cerrado — Floresta Viva vem transformando áreas degradadas em territórios de vida e produção sustentável. Desenvolvido em parceria com a Associação dos Produtores Agroecológicos do Alto São Bartolomeu (Aprospera), no Assentamento Oziel Alves, o trabalho une restauração ecológica e agricultura familiar dentro da Área de Proteção Ambiental (APA) do Planalto Central. A coordenadora de projetos Jimena Stringuetti explica que a iniciativa tem como foco a restauração produtiva de áreas degradadas por meio dos Sistemas Agrocerratenses (SACE) — uma metodologia que integra o plantio de espécies nativas do Cerrado com cultivos agrícolas sem potencial invasor, conciliando restauração ecológica e produção de alimentos.

"No Distrito Federal, serão restaurados seis hectares distribuídos em 13 propriedades familiares, priorizando áreas afetadas por incêndios e pela invasão de gramíneas exóticas. O trabalho é participativo, com diagnóstico, mapeamento e acompanhamento técnico realizados por membros da própria comunidade, em parceria com a Rede de Sementes do Cerrado. Quando a restauração nasce dentro do território, ela tem muito mais chance de dar certo, porque respeita o modo de vida das pessoas e valoriza o conhecimento tradicional sobre o Cerrado", ressaltou.

A iniciativa também conta com o apoio do ICMBio, gestor da APA do Planalto Central, fortalecendo as ações de prevenção a incêndios e de monitoramento da vegetação nativa. "As famílias agricultoras da Aprospera estão implantando os SACEs, que combinam espécies nativas com cultivos agrícolas sustentáveis. Isso permite recuperar áreas degradadas e, ao mesmo tempo, manter a produção de alimentos, fortalecendo a soberania alimentar e a renda das famílias. É a prova de que é possível produzir e cuidar da natureza ao mesmo tempo", completou Jimena.

Para Laura Antoniazzi, colíder da Força-Tarefa Restauração da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura e especialista em agricultura e sustentabilidade, o Cerrado é peça-chave na agenda climática global. "É muito importante aliar produção sustentável com conservação no Cerrado, que é conhecido como a "caixa d'água do Brasil". No DF, se destacam iniciativas e organizações que trabalham com restauração com semeadura direta, também conhecida por "muvuca". São vários exemplos de plantios no DF e entorno, e organizações de base comunitária que coletam e comercializam sementes nativas para restauração, de espécies de campos, savanas e florestas do bioma", observou. 

"Durante a COP 30, muitas instituições apresentarão iniciativas que unem restauração inclusiva e valorização da sociobiodiversidade do Cerrado. Assim como o bioma da Amazônia, o Cerrado tem muita relevância do ponto de vista estratégico para prover funções ecossistêmicas, cada vez mais necessárias em cenários de mudança do clima", completou.

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postado em 11/11/2025 08:00 / atualizado em 11/11/2025 08:00
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