UMBANDA

Fé, caridade e resistência: Dia Nacional da Umbanda é celebrado neste sábado

Terreiros do DF comemoram neste sábado (15/11) o Dia Nacional da Umbanda, religião brasileira nascida do encontro entre tradições africanas, indígenas, católicas e kardecistas

Babalorixá Milton ti Òiyà, do Centro Espírita Caboclo Aymoré e Pai Manuel de Angola (Ceama), em Samambaia
 -  (crédito: Fotos: Bruna Gaston CB/DA Press)
Babalorixá Milton ti Òiyà, do Centro Espírita Caboclo Aymoré e Pai Manuel de Angola (Ceama), em Samambaia - (crédito: Fotos: Bruna Gaston CB/DA Press)

A Umbanda retrata a alma brasileira. Nascida do encontro entre tradições africanas, indígenas, católicas e kardecistas, a religião carrega o significado da diversidade que forma o país. Nos terreiros, fé e caridade caminham juntas, com espaços onde o acolhimento, o auxílio espiritual e o trabalho social se transformam em atos de solidariedade.

Fique por dentro das notícias que importam para você!

SIGA O CORREIO BRAZILIENSE NOGoogle Discover IconGoogle Discover SIGA O CB NOGoogle Discover IconGoogle Discover

Celebrado neste sábado (15/11), o Dia Nacional da Umbanda remonta a 1908, quando, em 15 de novembro, o médium Zélio Fernandino de Moraes incorporou o Caboclo das Sete Encruzilhadas. Para muitos, trata-se do marco inicial da religião. A data é mais do que uma comemoração, é um símbolo de resistência, reafirmando o direito de existir e professar a fé em um Brasil que, em sua pluralidade, também é sagrado.

O Centro Espírita Assistencial Nossa Senhora da Glória (Ceansg), na Asa Norte, que completou 60 anos em 15 de agosto, comemora a data há mais de uma década. "Nós celebramos há 12 anos, ano seguinte à sanção da lei. O terreiro fará uma homenagem a todos os orixás e guias da casa, com pontos cantados para cada um deles (neste sábado, às 20h). Em determinado momento, a assistência é convidada a tomar um passe numa corrente magnética formada por médiuns incorporados por alguma das linhas homenageadas. Ao final, todos recebem as frutas consagradas", conta Gilberto Marcos, adjuntó da casa.

Gilberto Marcos, Adjuntó do Terreiro, e Celsio da Costa, presidente espiritual do CEANSG (da esquerda para a direita)
Celso Faria (D), presidente espiritual do Centro Espírita Assistencial Nossa Senhora da Glória (Ceansg), e Gilberto Marcos, adjuntó do terreiro (foto: Vitória Torres/CB)

Para ele, a religião é guiada por valores universais: "Umbanda é amor, paz, caridade e humildade. Todos deveriam doar um pouco de si, deixando de lado o preconceito e a vaidade, entendendo que todos nós somos irmãos perante a Deus".

A religião da Umbanda tem como objetivo também a caridade e as ações sociais. "Ajudamos em torno de 600 famílias com cestas básicas ao longo do ano. Já no atendimento espiritual, atendemos entre 200 e 400 pessoas por dia de trabalho", completa.

Terreiro do Centro Espírita Assistencial Nossa Senhora da Glória (Ceansg)
Representações de Oxalá e de Iemanjá no Ceansg (foto: Vitória Torres/CB)

Ele explica as diferenças entre as religiões afro-brasileiras. Segundo Gilberto, o Candomblé é mais antigo e com rituais conservadores, focado no culto direto aos orixás. A Umbanda é mais recente, surgida no Brasil, e sincretiza elementos de várias culturas, com incorporação de caboclos e pretos-velhos.

Na estrutura do Ceansg, há a Sociedade Assistencial Recanto da Mãe Jurema (Sarema), que promove ações sociais, como distribuição de cestas básicas, almoços e doação de roupas, entre outros, para pessoas em situação de vulnerabilidade. O centro trabalha, ainda, para montar uma creche. 

Sincretismo

O presidente da Federação de Umbanda e Candomblé de Brasília, Rafael Moreira, afirma que o DF tem mais de 700 terreiros. "Hoje, podemos andar com nossas guias e roupas de proteção nas ruas. É um trabalho longo que os mais velhos começaram e que continua para combater a intolerância. Ainda somos perseguidos, mas queremos garantir que as futuras gerações possam escolher a nossa religião sem preconceito", destaca.

Cada terreiro tem suas singularidades. Alguns, por exemplo, adotam atabaques e imagens de orixás africanos. Outros não fazem uso do instrumento, e as imagens de santos católicos representam os orixás, devido ao sincretismo religioso

Em Samambaia, o Centro Espírita Caboclo Aymoré e Pai Manuel de Angola (Ceama) também celebra a data. O babalorixá Milton ti Òiyà, 58 anos, ministro religioso desde 1996, ressalta que a Umbanda é essencialmente latino-ameríndia, com referências africanas. "Na África, Umbanda não existe. Nossa missão é fazer trabalhos filantrópicos, como entrega de cestas, sopas, agasalhos e cobertores. A caridade é um foco de grandeza e crescimento espiritual". O espaço vai comemorar a ocasião com um encontro religioso, homenageando as entidades mestres do templo.

 12/11/2025 Bruna Gaston CB/DA Press. Babá Newton , pai de Santo
Centro Espírita Caboclo Aymoré e Pai Manuel de Angola (Ceama), em Samambaia (foto: Bruna Gaston CB/DA Press)

A estudante Anna Gomes, 21 anos, de Ceilândia, frequenta a religião há cinco anos. "Eu sempre tive muita fé em Deus, mas comecei a estudar a história do Brasil e percebi que precisava conhecer mais sobre as religiões de matriz africana. Desde então, nunca parei de frequentar. Na Umbanda, eu vejo caridade, doação e ausência de julgamentos. Você pode ser quem você é, sem fazer mal a ninguém. Eu tenho me encontrado como pessoa", diz.

Solidariedade

Em Ceilândia, o Centro Espírita Caminheiros de Santo Antônio de Pádua (CECSAP) mantém um projeto social voltado a mulheres em vulnerabilidade. A coordenadora e médium da casa de Umbanda, Suzete Cunha, conta quem entre 2021 e 2022, 113 mulheres foram ajudadas só no curso de costura. Em 2024, foram 139. O foco é sustentável, criando bolsas com retalhos.

“Nossa casa é laica, para que todos possam participar. Aqui dentro a gente não fala sobre a nossa fé. Nosso público conta com muitas mulheres que chegam desempregadas ou passando por dificuldades. Eu me sinto muito grata por estar aqui e por ser umbandista. Sei que estamos cumprindo a nossa missão não apenas no lado espiritual, mas também no acolhimento material e profissional”, observa.

 12/11/2025 Bruna Gaston CB/DA Press. Suzete Cunha, coordenadora da Ascap, projeto Costura Social
Suzete Cunha é coordenadora pedagógica do CECSAP (foto: Bruna Gaston CB/DA Press)

A ação social não se expande porque depende da legalização da ocupação da área onde está há 31 anos. 

Para ela, o contato direto com o terreiro tem transformado a percepção das pessoas sobre o que acontece nesses espaços. “É muito gratificante perceber que a comunidade está se aproximando da Umbanda e enxergando a religião de uma forma diferente. Elas chegam aqui e veem algo que não passava no imaginário da maioria, que achavam que seria misterioso. Mas, quando conhecem, percebem que é um lugar de fé, acolhimento e muito trabalho voltado ao bem”, avalia.

A dirigente destaca o papel do terreiro na superação de preconceitos históricos. “Vamos quebrando barreiras de preconceito. É uma entidade de portas abertas para quem quiser ser voluntário”, disse. “Tem muita gente que não é da Umbanda, mas que contribui imensamente com o trabalho. E isso mostra que o respeito e a solidariedade estão acima de qualquer crença.”

  • Google Discover Icon
postado em 14/11/2025 05:00
x