MÚSICA

Gabeu mistura gêneros ao sertanejo em álbum com regravações de modas caipiras

Pioneiro do queernejo, filho de Solimões une guitarras e modas caipiras em releituras provocadoras que homenageiam o interior e desafiam o conservadorismo do gênero

Gabeu mistura sertanejo, pop, eletrônica e rock em suas produções  -  (crédito: Divulgação )
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Gabeu mistura sertanejo, pop, eletrônica e rock em suas produções - (crédito: Divulgação )

Pioneiro do queernejo — movimento que une a música sertaneja às vivências LGBTQIA+ — e filho de Solimões, dupla de Rio Negro, Gabriel Silva Felizardo, conhecido artisticamente como Gabeu, mistura diferentes estilos musicais em novo EP. A releitura do single Chitãozinho e Xororó é a segunda faixa do projeto ROCK BRAVO, dedicado a regravações de modas caipiras com uma nova roupagem, que chega às plataformas digitais nesta quinta-feira (24/7). 

Gabeu, que já havia lançado Minas Gerais como primeira faixa do projeto, resgata mais uma clássica canção que o marcou desde a infância. Em entrevista ao Correio, ele revela ter prestado atenção na música ao assistir a série As Aventuras de José e Durval, do Globoplay, cuja reprodução referencia duas aves brasileiras. “É uma batalha entre o violão e a guitarra. No final, ambas se completam”, resume. 

Diferente do sertanejo convencional, Gabeu busca fundir pop, eletrônica e rock em suas criações. Em ROCK BRAVO, ele resgata o adolescente rebelde que julgava o sertanejo cafona e conservador, reivindicando suas origens e criando um espaço representativo no gênero. 

Gabeu busca contemplar novas vivências dentro do sertanejo. Atualmente, percebe muitos artistas LGBTQIA+ cantando e vivendo vidas amorosas e sexuais sem medo. Ao unir comédia com "amor rural", o artista acredita ter estabelecido uma ponte com leveza. “Se eu chegasse querendo chutar a porteira, acho que teria muita resistência”, confessa. 

Embora cante sobre amor em geral, Gabeu opina que suas músicas sempre vão ser lidas como uma narrativa queer. “Uso uma saia, um chapéu diferente, maquiagem pesada. E faz sentido para mim falar sobre coisas caipiras estando vestido assim”, argumenta. “Uso chapéu de palha, mas também látex, couro e jeans. Me diferencio de tudo ao meu redor”

Rock Bravo é um personagem inspirado em uma história cantada por Léo Canhoto & Robertinho. “Assim que ele chega na cidade, todo mundo fica com medo, causa um estranhamento, ninguém sabe o que ele vai fazer. Quis reivindicar esse lugar de alguém que causa essa angústia, um sentimento que tenho em relação ao mercado sertanejo”, explica Gabeu. “Visto essa carapuça”. 

Ao produzir algo único no sertanejo, Gabeu acredita alcançar pessoas que normalmente não consomem o gênero. “No palco, geralmente são homens que performam muita masculinidade. Quando são mulheres, também ficam nesse padrão heteronormativo. Por falta de identificação, as pessoas acabam presumindo que elas não gostam de sertanejo”, reflete. 

Resgatar composições do interior é, para Gabeu, revisitar uma infância possivelmente dolorosa para muitas pessoas LGBTQIA+. “Mas já recebi muita mensagem positiva de que o meu trabalho ressignificou memórias de afeto e família”, celebra. Foi ao ler comentários surpresos com a relação boa com o pai que Gabeu percebeu que alguns parentes são aplaudidos por fazer o mínimo. No lado positivo, essa experiência familiar acabou aproximando muitos pais de filhos LGBT

Mesmo com o estereótipo de que gays só consomem músicas pop — o que Gabeu, fã de Lady Gaga, também descreve como um refúgio —, o artista destaca que o Brasil é plural em todos os seus contextos, cultura que deve refletir uma diversidade. 

Equilibrar o respeito à tradição com a vontade de reinventar o sertanejo contempla um risco de reprovação. Com isso, Gabeu é direto: “Eu não me importo. Vai ter quem ache que estou estragando a música e criticar. Acontece comigo.” Apesar disso, ele destaca que muitos têm acesso a música caipira por mérito dele. 

A estética também é chamativa — muitas vezes, antes mesmo da música. “No meu caso, como o visual agrada e desagrada muito, acho que tem gente que dá play justamente porque desagradou. Aí a pessoa fica lá me criticando, me xingando, mas tá lá, me ouvindo, e me seguindo”, salienta. 

Na contramão do sertanejo tradicional, Gabeu consolida um espaço onde a diversidade encontra raízes e inovação. Ao misturar tradição e ousadia, ele desafia estereótipos, provoca o público e abre caminho para novas narrativas no universo da música caipira.

Confira a entrevista completa: 

 

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postado em 24/07/2025 00:10