
O carnaval é uma das épocas mais agitadas do ano, tanto em termos de diversão quanto para a economia. No Distrito Federal, a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) estima um volume financeiro de mais de R$ 320 milhões em atividades típicas do turismo durante a folia, um aumento de cerca de 1,5% em relação ao ano passado, segundo a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Distrito Federal (Fecomércio-DF). O valor considera diversos segmentos, como alimentação, transporte de passageiros e hospedagem, além de serviços ligados à economia criativa, incluindo contratação de artistas, confecção de fantasias, aluguel de equipamentos, segurança privada e marketing.
- Leia também: Carnaval 2025: cidade da segurança pública é inaugurada no DF
- Leia também: Drones vão reforçar segurança durante o período de carnaval no DF
Artesã há 13 anos, Alana Nunes, 34 anos, faz e vende roupas e acessórios para o carnaval desde 2018, e os divulga no Instagram (@laninaloja). Nesta época, ela costuma fazer cerca de três peças por dia, trabalhando de 8h até 22h. Em outros meses, essa seria a quantidade produzida por semana. Seu dia a dia inclui buscar referências, deixar as peças prontas para venda em feiras e lojas colaborativas do Distrito Federal e conciliar essas tarefas com o trabalho em um sebo de livros no Gama, no qual conta com a ajuda do irmão e da mãe. "Acaba que se torna um negócio familiar, tem peças que minha mãe me auxilia na produção, e ela recebe; pago meu irmão para cuidar do sebo, e por aí vai."
Mesmo com a rotina, Alana reforça que o ganho financeiro é superior em relação aos outros meses do ano. "De uns dois, três anos para cá, as vendas aumentaram, e consigo tirar um um retorno financeiro bem maior com peças que eu produzo um pouco mais rápido. Querendo ou não, tem mais produtos para venda e, consequentemente, vende mais", explica. Apesar do árduo trabalho, a diversão não fica de lado. Neste ano, a artesã conta que, durante o trabalho, também está aproveitando os blocos carnavalescos. "Querendo ou não, a gente acaba curtindo. Quando tem exposição nas feiras, sempre tem um bloquinho, e aproveitamos também. Todo mundo fica mais animado e é mais gostoso de atender às demandas."
Geração de empregos
Para José Aparecido Freire, presidente do sistema Fecomércio-DF, o carnaval impulsiona não apenas a contratação formal, mas também a geração de oportunidades temporárias em diversos segmentos. "Sabemos que há um número ainda maior de empregos informais e temporários essenciais para a realização do evento. São trabalhadores autônomos, ambulantes, seguranças, técnicos de som e luz, produtores culturais e muitos outros que encontram oportunidade de renda extra", pontua.
Neste ano, de acordo com a Secretaria de Cultura e Economia Criativa (Secec), não haverá desfile de escolas de samba no DF. Mesmo sem a atração, os blocos ocorrerão normalmente, totalizando 62 concentrações em três pontos fixos: dois na Esplanada dos Ministérios e um no Parque da Cidade.
- Leia também: Carnaval em Brasília: veja a programação oficial completa
- Leia também: Carnaval em Brasília: confira as alterações no trânsito
Criado em 2018, o Bloco das Montadas gera, aproximadamente, 200 empregos diretos. Além de equipes de direção artística, destacam-se seguranças, brigadistas, músicos, artistas drag queens, contrarregras, designers, assessores de imprensa, entre outros. "O carnaval fomenta a cadeia produtiva da cultura, beneficiando desde pequenos empreendedores até grandes fornecedores, fortalecendo a economia criativa", diz Ruth Venceremos, representante do bloco.
Já o Suvaco da Asa, existente desde 2006, conta com cerca de 400 trabalhadores, incluindo 170 músicos e dançarinos; 110 seguranças e brigadistas; profissionais responsáveis por limpeza, posto médico, ambulância técnica e produção. Além disso, 50 pessoas vendem adereços de carnaval e fantasias, pipoca, lanches e bebidas.
Pablo Amorim, presidente do Suvaco da Asa, comemora a expansão das festas além do Plano Piloto, ocorrendo no Cruzeiro, Guará, São Sebastião, Planaltina, Ceilândia, Taguatinga, Águas Claras e Gama; e a atração de foliões de outros estados. "Vejo pessoas que iam para Recife, Salvador, Rio de Janeiro ou São Paulo, que hoje ficam aqui em Brasília para pular o carnaval. Hoje também vêm pessoas dos estados adjacentes, como Minas Gerais e Goiás."
Rotina intensa
Valéria Lamounier, 58, trabalha com costura criativa há 15 anos. Enquanto isso, é pedagoga na Secretaria de Educação (SEEDF), em Samambaia. O tempo destinado à criação e à confecção de peças ocorre nos momentos de folga e até mesmo durante as madrugadas, participando de feiras e espaços para divulgação do artesanato aos finais de semana e feriados.
Quando chega o carnaval, a rotina de trabalho da artesã é intensa, pois, além de conciliar os dois empregos, tem alta demanda. "Tenho que me desdobrar para atender às encomendas e dispor de tempo para venda dos produtos em feiras de artesanato. Então, cada minuto do dia é precioso. Mas é muito prazeroso."
Ela cita fatores que dificultam o processo de criação, como a falta de matéria-prima para produção das peças, alta concorrência entre artesãos e o aumento nos preços. "Por causa disso, temos de recorrer às compras on-line, que nos proporcionam praticidade. Ao mesmo tempo, com elas, nos deparamos com outros desafios: restrições de entregas, falta de confiança nos sites e aplicativos, falta de informações claras sobre os produtos, preocupações com as formas de pagamento, entre outras", explica.
Limitações
Zenilda Correia da Silva, 63, trabalha como ambulante durante a folia, vendendo lanches há mais de 10 anos. Um dia antes, ela precisa preparar os produtos, levando-os prontos ou pré-prontos para os clientes ao longo do dia. Chegando em casa, ela começa tudo de novo, indo ao mercado para comprar o que falta para a próxima leva.
Para trabalhar nos blocos, a vendedora precisa participar de uma seleção da Coordenadoria do DF, que disponibiliza vagas limitadas para cada concentração. Apesar do lucro, Zenilda aponta que essa limitação pode dificultar as vendas. "Como eu não tive condição de ir para outros lugares, porque só tinha autorização para aquele local, não vendi praticamente nada. Fiquei bastante frustrada, porque imaginamos que vamos para a rua ganhar dinheiro, e nem sempre isso acontece", relata, referindo-se a um evento no ano passado.
Nesse sentido, a microempreendedora, que também integra a diretoria do Sindicato do Comércio de Vendedores Ambulantes do DF (Sindvamb-DF), ressalta a importância do amparo por parte do governo. "Se é um evento grande, eu acho que, nesses períodos, eles deveriam colocar, ao menos, um banheiro. Nós vamos porque é o nosso trabalho e nós precisamos, mas que é sofrido, é."
Impasses
Aulas de música, produção de bandas ou eventos, gravações musicais em casa, shows e apresentações aos fins de semana, além de estudo diário de trombone, são algumas das atividades que compõem a rotina de Bruno Portella, 37 anos, que se intensificam no carnaval. Trabalhando com a festividade desde 2017, ele toca em várias bandas, blocos e fanfarras do DF, além de produzir um evento de pré-carnaval desde 2020.
O músico considera que o maior desafio está em fazer a festa sobreviver por conta de dois fatores: a desvalorização e a repressão. "Parece que, cada vez mais, uma parte da sociedade vê o carnaval como um tumulto que precisa ter um fim, o que vem diminuindo a importância e limitando a diversidade cultural brasileira, já que dificulta o surgimento de novos blocos e manifestações culturais."
Por causa disso, Bruno observa que, antes, era comum ver colegas músicos fazendo vários shows no carnaval; às vezes, tocando duas ou três vezes no mesmo dia, o que, segundo ele, não ocorre hoje. "Isso ficou meio difícil de se ver ultimamente, com essa repressão aos movimentos carnavalescos. Está mais comum ver as lacunas nas agendas", lamenta. Por outro lado, o artista acredita que este é um momento de maior evidência cultural, uma oportunidade de manter a chama acesa.
Investimento
De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADc) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), há mais de 150 mil empresas vinculadas à economia criativa no DF. Carolina Palhares, professora do Centro de Excelência em Turismo (CET) da Univerisdade de Brasília (UnB), defende que, para o crescimento do evento na região, é necessário que outras fontes tenham verba específica. "O financiamento dos blocos de carnaval e das escolas de samba tem vindo do Fundo de Apoio à Cultura (FAC), que já é um recurso limitado e precisa contemplar outras manifestações artístico-culturais durante todo o ano", diz.
Para ela, isso torna necessária a implementação de medidas voltadas aos profissionais informais que trabalhem na área. "Muitos artistas enfrentam dificuldades para monetizar seu trabalho além da temporada carnavalesca. Então, políticas públicas e iniciativas privadas que promovam a profissionalização, a proteção intelectual e o acesso a mercados são essenciais para fortalecer essa cadeia."
*Estagiária sob a supervisão de Marina Rodrigues