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Dino atenua culpa de três réus da trama golpista e descarta anistia

Ministro vota pela condenação dos oito envolvidos na ofensiva, mas vê uma menor responsabilidade de Augusto Heleno, Paulo Sérgio Nogueira e Alexandre Ramagem

Dino adotou tom de equilíbrio, classificando o processo como
Dino adotou tom de equilíbrio, classificando o processo como "um julgamento como qualquer outro" - (crédito: Luiz Silveira/STF)

Em seu voto sobre a trama golpista, o ministro Flávio Dino, segundo magistrado da Primeira Turma do STF a se manifestar nesta terça-feira, votou pela condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro e do ex-ministro Walter Braga Neto. O magistrado apontou os dois como líderes do plano antidemocrático — na contramão do entendimento do relator, ministro Alexandre de Moraes, que apontou Bolsonaro como o único líder. Dino também diferiu do colega ao avaliar que três dos oito réus tiveram "níveis de culpabilidade" menores na ofensiva extremista: os ex-ministros Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira e o ex-diretor da Abin Alexandre Ramagem, hoje deputado federal.

No mérito, Dino votou pela condenação de todos os oito réus. Contudo, defendeu redução de penas para Heleno, Nogueira e Ramagem, por participação "de menor importância".

"Juízes não podem ser substituídos por inteligência artificial. Julgamentos exigem humanidade, equilíbrio e análise equitativa", disse, lembrando que o artigo 29 do Código Penal permite redução abaixo do mínimo legal em participações secundárias.

Ao analisar os autos, Dino ressaltou que os fatos estão comprovados. "Praticamente, os fatos são incontroversos quanto ao que empiricamente ocorreu no nosso país", afirmou. Rejeitou a tese de meros atos preparatórios: "Não há, nesse caso, delito meio e delito fim. Foram duas condutas com desvalor próprio, que merecem ser mensuradas… Não se cuidou de mera cogitação. Houve atos executórios que expuseram o bem jurídico, o Estado Democrático de Direito à gravíssima lesão", enfatizou.

Para demonstrar o caráter violento das ações, Dino listou episódios entre 2021 e 2023: invasão da Esplanada, ataques contra policiais, fechamento de rodovias federais, tentativa de fechar aeroportos, bomba em Brasília e rompimento de barreiras policiais em 8 de janeiro.

"Não se tratou de violência contra coisas, mas contra pessoas, contra instituições", destacou. Ele também ironizou os acampamentos golpistas: "Se você está com intuito pacifista, vai à missa, vai ao culto. Mas não foi isso. Os acampamentos foram na porta de quartéis, onde há fuzis, metralhadoras e tanques."

Logo na abertura do voto, Dino adotou tom de equilíbrio, classificando o processo como "um julgamento como qualquer outro", conduzido com respeito ao devido processo legal, à ampla defesa e ao contraditório. Ele saudou o trabalho da Procuradoria-Geral da República (PGR) e dos advogados, e elogiou Moraes, a quem atribuiu um voto "de muita qualidade".

"Este julgamento é absolutamente normal dentro dos parâmetros consagrados pelo legislador. Não é vingança nem ditadura judicial. É a afirmação da democracia construída sob a Constituição de 1988", afirmou.

Ele destacou a gravidade dos ataques ao Estado Democrático de Direito e comparou os delitos às penas severas previstas para crimes patrimoniais. "Não é normal que a cada 20 anos o país enfrente ameaças de ruptura constitucional. Crimes contra a democracia não podem ser tratados como menos relevantes que crimes contra o patrimônio", disse.

O magistrado lembrou que a Constituição classifica como inafiançáveis práticas como terrorismo e ações de grupos armados contra a ordem constitucional, reforçando a necessidade de resposta penal proporcional.

Dino também afastou a ideia de que o julgamento representaria perseguição às Forças Armadas. Segundo ele, trata-se de responsabilização individual dos acusados, e não de instituições. Defendeu que a soberania nacional exige forças apartidárias, sem envolvimento em manifestações políticas — como os acampamentos montados diante de quartéis no fim de 2022 — e que a decisão do Supremo deve servir de alerta e prevenção contra novas tentativas de ruptura democrática.

Em outro momento, o ministro foi enfático ao rejeitar a possibilidade de indulto ou anistia para os envolvidos. "Que interesse público haveria em perdoar aquele que foi devidamente condenado por atentar contra a própria existência do Estado Democrático, de suas instituições e institutos mais caros?", questionou.

Para reforçar seu entendimento, citou declarações dos colegas da Corte: "Crime contra o Estado Democrático de Direito é um crime político e impassível de anistia, porquanto o Estado Democrático de Direito é uma cláusula pétrea que nem mesmo o Congresso Nacional pode suprimir", frisou, recordando Luiz Fux. Ele também mencionou uma citação da ministra Cármen Lúcia: "Um indulto, a anistia, resultaria na mensagem indevida a detratores da democracia e à Constituição de que eles poderiam continuar a praticar os crimes".

Interpretação

No exame das preliminares, Dino afirmou que a decisão da Câmara dos Deputados de sustar processos criminais deve ter interpretação restrita, sem poder anular acusações já recebidas pelo Supremo. Reiterou que não houve cerceamento de defesa, que os advogados tiveram acesso às provas desde os inquéritos e que é competente o STF para julgar ex-autoridades, diante da jurisprudência sobre prorrogação do foro.

Ele rebateu críticas sobre a atuação dos juízes no processo penal: "O juiz não é uma samambaia jurídica. Quando faz perguntas, demonstra interesse no caso e busca compreender melhor as nuances. Isso fortalece o processo", afirmou. Ele também defendeu a validade das colaborações premiadas, desde que corroboradas por provas independentes — o que, segundo ele, ocorreu no caso da trama golpista.

O magistrado reiterou que não há espaço para benevolência. "Não houve meras reflexões postas em cadernos. A cogitação foi acompanhada de atos executórios. As penas são congruentes. Esses crimes não admitem benevolência, porque significaram um ataque frontal ao Estado Democrático de Direito", declarou.

 

 

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postado em 10/09/2025 03:55
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