Música

Artistas brasileiros lamentam a morte de Jimmy Cliff, lenda do reggae

Jimmy Cliff morreu, nesta segunda-feira (24/11), aos 81 anos. Ele deixa um legado que formou gerações de músicos pelo mundo. Bandas brasilienses, como Natiruts, Maskavo Roots e Tijolada Reggae, trazem o DNA do jamaicano

Jimmy Cliff, um dos nomes mais influentes da história do reggae, morreu nesta segunda-feira (24/11), aos 81 anos -  (crédito: JOSE JORDAN)
Jimmy Cliff, um dos nomes mais influentes da história do reggae, morreu nesta segunda-feira (24/11), aos 81 anos - (crédito: JOSE JORDAN)

Morreu, aos 81 anos, o cantor e compositor jamaicano Jimmy Cliff, um dos nomes mais influentes da história do reggae. A informação foi confirmada pela família do artista na manhã desta segunda-feira (24/11), por meio de comunicado publicado nas redes sociais. A nota, assinada pela esposa, Latifa, informou que o músico morreu após uma convulsão que teve como consequência uma pneumonia durante a internação. Ele deixa três filhos, Aken, Lilty e a brasileira Nabiah Be.

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"É com profunda tristeza que compartilho a notícia de que meu marido, Jimmy Cliff, faleceu devido à uma convulsão seguida de pneumonia", escreveu Latifa. "Sou grata à família, amigos e colegas de trabalho que compartilharam esta jornada com ele. A todos seus fãs ao redor do mundo, saibam que o apoio de vocês foi a força dele durante toda a carreira. Ele realmente apreciava cada um de vocês pelo carinho", destacou.

A esposa do músico agradeceu a toda a equipe médica que, segundo ela, foi "extremamente atenciosa e prestativa durante este difícil processo". "Jimmy, meu querido, que você descanse em paz. Seguirei seus desejos. Espero que todos respeitem nossa privacidade neste momento delicado. Mais informações serão fornecidas posteriormente. Até logo, lenda", finalizou Latifa.

Nascido em Saint James, Jamaica, em 1944, Jimmy Cliff começou a carreira ainda na adolescência, aos 14 anos, quando se mudou para a capital Kingston. Foi lá onde o músico conheceu Leslie Kong, que posteriormente se tornou um dos produtores mais importantes do reggae, e conquistou a gravadora britânica Island Records.

Aos 20 anos, o jamaicano se mudou para Londres e, em 1976, estreou oficialmente no mundo da música com Hard road to travel, se tornando um dos primeiros artistas do país a lançar um disco por um selo britânico. Mais tarde, a Island Records também se tornaria a gravadora de Bob Marley — Cliff, inclusive, esteve presente durante a primeira audição do músico aos empresários.

O ponto de virada da carreira do artista, porém, veio três anos depois, com o lançamento da faixa Wonderful world, beautiful people, inspirada por sua primeira passagem pelo Brasil. A música chegou ao 6° lugar nas paradas britânicas e rodou o mundo, ficando marcada como um dos primeiros sucessos da música jamaicana fora da Jamaica.

Um dos pilares do reggae, Cliff lançou mais de 30 álbuns ao longo da carreira e foi vencedor de dois Grammys — o de Melhor gravação de reggae, por Cliff hanger, em 1986, e o de Melhor álbum de reggae, por Rebirth, em 2013. O artista também foi homenageado com a Ordem de Mérito da Jamaica e foi incluído ao Rock and Roll Hall of Fame em 2010. Em 2022, Jimmy Cliff lançou o último álbum da carreira, Refugees, o primeiro do artista em 10 anos. O trabalho inclui colaborações com artistas como Wyclef Jean e Dwight Richards e com a filha do músico, Lilty.

Para além do mundo da música, o cantor também se aventurou no cinema ao protagonizar o filme The harder they come, ou Batalha sangrenta (1972). O longa conta a história de Ivan, um jovem jamaicano que sonha em ser um cantor de reggae bem-sucedido, mas acaba se envolvendo com produtores musicais corruptos e traficantes de drogas. O artista foi responsável por grande parte da trilha sonora da produção. Outro sucesso de Cliff nos cinemas foi I can see clearly now, música tema de Jamaica abaixo de zero (1993). A faixa, originalmente cantada por Johnny Nash, alcançou, na época, a 18ª posição nas paradas da Billboard Hot 100 dos Estados Unidos.

"Jimmy Cliff é um ícone jamaicano. Está presente na efervescência dos ritmos da ilha dos anos 1960, transitando entre o ska, o rocksteady e o reggae. The harder they come, tanto o filme como o disco, são marcos da cultura fora dos eixos", declarou ao Correio Marcelo Vourakis, vocalista da formação original do Maskavo Roots.

Rogério Fagundes, integrante do Tijolada Reggae, também destacou o longa como um dos grandes feitos de Cliff. "Ele foi um dos artistas primordiais para a divulgação do reggae além dos limites da Jamaica, desde 1972, com o filme The harder they come. Foi a partir daí que o ritmo começou a tomar alcances bem diferenciados no mundo, tudo por força da música do Jimmy Cliff", ressaltou.

"O seu legado é muito especial, por tudo que ele fez para o alcance do reggae no mundo e por suas letras diferenciadas de fé, esperança e de lutas por identidades culturais. Tudo isso é muito potente na música dele, além das lindas melodias e harmonias", acrescentou Rogério.

Kiko Peres, guitarrista do Natiruts, definiu Cliff como "o cara que abriu as portas do reggae para o resto do mundo". "Ele veio antes mesmo do Bob Marley. A importância dele para música reggae não tem preço", apontou. "O artista se vai, mas a obra fica imortalizada", afirmou.

Para o vocalista do Rappa, Marcelo Falcão, Cliff é "referência máxima do reggae". "Dos 37 álbuns dele, eu tenho 19. Fora os compactos! Ele foi um gigante que deu a cara para que a Jamaica tocasse nas rádios do mundo. Descanse em paz".

"Com a partida de Jimmy Cliff, perdemos mais um dos pilares do reggae mundial que, ao lado de Bob Marley, Burning Spears e outras peças fundamentais, foi essencial na criação e difusão do ritmo pelo mundo", lamentou Marcelo Mira, vocalista e fundador do Alma Djem. "A grande conexão que ele tinha com o Brasil e com a música brasileira, especialmente com a Bahia, era muito especial", destacou.

Conexão brasileira

Em 1968, o músico jamaicano veio ao Brasil pela primeira vez, para apresentação no Festival Internacional da Canção, no Maracanãzinho, Rio de Janeiro. A passagem, que inicialmente seria apenas para o evento, resultou no disco Jimmy Cliff in Brazil, trabalho com três versões de músicas brasileiras, incluindo Andança, conhecida na voz de Beth Carvalho. Na regravação do compositor, a faixa se tornou The lonely walker.

Ainda durante a passagem, Cliff escreveu um dos principais sucessos da discografia — Wonderful world, beautiful people, inspirado pela recepção e energia do público brasileiro durante sua apresentação no Maracanãzinho durante o festival. Many rivers to cross, outro clássico da carreira, foi inspirada no que o jamaicano ouvia falar do racismo no Brasil. "Muitos rios para atravessar/E é apenas a minha vontade que me mantém vivo/Fui derrotado, arrastado pela correnteza durante anos/E eu sobrevivo apenas por causa do meu orgulho", cantou o artista.

A partir de 1980, as passagens de Cliff pelo Brasil se tornaram cada vez mais frequentes. Neste mesmo ano, por exemplo, o jamaicano fez uma turnê com Gilberto Gil que passou pelas capitais Belo Horizonte, Salvador, Recife, São Paulo e Rio de Janeiro. Nas redes sociais, o baiano lamentou a morte do parceiro musical. "Jimmy Cliff influenciou e seguirá influenciando minha música. Obrigado por tanto", escreveu Gil.

Com o também baiano Lazzo Matumbi, Cliff escreveu Me abraça e me beija, um dos grandes sucessos da música brasileira, gravado por Margareth Menezes. "Meu amigo Jimmy Cliff partiu. Tive a honra de poder acompanhá-lo por três anos, em turnês no mundo inteiro, e abrir o show deste mestre", contou o percussionista em post no Instagram. "Ficam as alegrias, o reggae que corre no sangue e a saudade dessa lenda da música mundial e referência para os amantes do reggae. Siga na luz, meu irmão!", exclamou.

A ministra da Cultura, Margareth Menezes, recorreu às redes sociais para lamentar a morte do jamaicano. "O mundo da música amanheceu triste com a partida de Jimmy Cliff, que ao lado de Bob Marley e Peter Tosh, colocou o reggae na sintonia do planeta. Tive a oportunidade de conviver com Jimmy quando ele veio morar na Bahia. Na época estava gravando meu disco Kindala", lembrou.

Durante 10 anos, o músico jamaicano morou em Salvador e, por meio da amizade com Margareth, conheceu a artista plástica Sônia Gomes, com quem teve a filha Nabiah Be, hoje atriz e cantora. No Brasil, Jimmy Cliff ainda gravou faixas com Ara Ketu, Olodum, Titãs e Cidade Negra. "Em 1990, quando Cliff esteve no Brasil, ele nos deu essa grande honra de participar da gravação do nosso disco Luz para viver, na faixa Mensagem", recorda Bino Farias, baixista do Cidade Negra. "Foi o nosso primeiro disco com uma gravadora e, quando chegamos no estúdio, havia um piano de cauda. Ele se sentou e começou a tocar e cantar maravilhosamente com aquela voz única", relatou o músico carioca.

Repercussão

Olodum

"O Olodum lamenta profundamente o falecimento de Jimmy Cliff, ícone mundial do reggae e artista cuja obra exerceu influência decisiva na música e na cultura afro-diaspórica. Jimmy Cliff deixou um legado de diálogo entre povos, defesa da paz, valorização das raízes e afirmação cultural"

Titãs

"Hoje a gente perde também um pedaço importante da nossa história. Tivemos a honra de dividir o palco com ele no Titãs Acústico. Vai em paz, Jimmy. Obrigada pela música e pela energia que você deixou por aqui"

Ara Ketu

"Em nome do Ara Ketu, expressamos nossa profunda gratidão por tudo o que Jimmy Cliff representou para nós. Sua passagem pela Bahia, em 1992, e a gravação de Samba reggae foram transformadoras e deram à nossa banda sua primeira projeção internacional. Jimmy acreditou na força do nosso som e ajudou a levar o samba-reggae para o mundo"

Maneva

"Jimmy Cliff é uma entidade eterna do reggae. A partida dele nos entristece profundamente, mas também reforça a grandiosidade de um legado que atravessa fronteiras e o próprio tempo. Seu som influencia o nosso, e o de todos que respiram o reggae. A obra dele segue moldando sonhos, caminhos e a sonoridade de quem busca a verdadeira essência do ritmo. Hoje dói, mas ao mesmo tempo, a gente agradece por ter vivido na mesma era que um mestre" 

UB40

"É com muita tristeza que recebemos a notícia do falecimento do ícone da música e superestrela original do reggae, Jimmy Cliff, aos 81 anos. Ele finalmente partiu para o outro lado do rio. Descanse em paz, Jimmy. Sua música viverá para sempre"

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postado em 25/11/2025 00:01 / atualizado em 25/11/2025 15:02
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