O Brasil alcançou marco histórico ao superar a meta de 1 milhão de oportunidades de formação profissional, aprendizagem, estágio e emprego formal para adolescentes e jovens em situação de vulnerabilidade. Desde 2020, a iniciativa Um milhão de oportunidades (1MiO), do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), viabilizou 1.294.165 oportunidades em todo o país. O avanço, no entanto, convive com um cenário desafiador: 8,9 milhões de jovens entre 15 e 29 anos ainda não estudam nem trabalham, segundo dados recentes da PNAD Contínua Educação.
Em cinco anos, 820.664 jovens conseguiram inserção no mercado de trabalho por meio de vagas de emprego formal, aprendizagem ou estágio, enquanto 473.501 concluíram formações voltadas ao desenvolvimento de competências para o mundo do trabalho, utilizando a plataforma digital do programa. Os números foram divulgados nesta quarta-feira (17/12), pelo Unicef e refletem uma articulação inédita entre setor público, empresas, organizações da sociedade civil e juventudes.
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Para a chefe de Educação do Unicef no Brasil, Mônica Dias Pinto, o resultado expressa a força da mobilização coletiva, mas também evidencia a urgência de avançar. “Um país que não reconhece suas juventudes como potência compromete o próprio futuro. O maior legado que uma nação pode deixar é preparar, educar e garantir direitos a crianças, adolescentes e jovens”, afirma.
Gargalos persistentes
Apesar dos avanços, o contexto social segue marcado por desigualdades. O Brasil tem hoje 48,6 milhões de jovens entre 15 e 29 anos, quase um quarto da população. Desses, 4,2 milhões acumulam dois ou mais anos de atraso escolar, e 28,8 milhões de crianças e adolescentes de 0 a 17 anos vivem em situação de pobreza multidimensional, com dois ou mais direitos básicos negados, como educação, saneamento ou moradia adequada.
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Outro entrave está na relação entre juventude e setor produtivo. Menos de 50% das empresas cumprem a cota legal de aprendizagem, e apenas 6% dos jovens elegíveis conseguem acessar essas vagas. No caso dos estágios, a desigualdade é ainda maior: apenas 2,6% dos estudantes do ensino médio conseguem estágio, frente a 8,4% no ensino superior.
“A transição da escola para o mercado de trabalho ainda é extremamente desafiadora. Não basta oferecer educação se não há vagas de estágio, aprendizagem e emprego. Essa ruptura faz com que muitos jovens acabem abandonando o mercado de trabalho precocemente”, avalia Mônica.
Jovens mães enfrentam barreiras adicionais
A maternidade precoce ainda é um dos principais fatores de exclusão de adolescentes e jovens do sistema educacional e do mercado de trabalho no Brasil. Muitas jovens abandonam a escola para cuidar dos filhos ou da família, o que compromete a conclusão da educação básica e dificulta a inserção profissional no futuro.
Segundo Mônica Dias Pinto, o desafio começa antes mesmo da entrada no mercado de trabalho. “Antes de vivenciarem a exclusão no mundo do trabalho, muitas meninas já enfrentam a impossibilidade de concluir a educação básica, porque precisam cuidar dos bebês ou das suas famílias. Por isso, esse é um problema que o Unicef acompanha de perto”, afirma.
Ela destaca iniciativas como a Busca Ativa Escolar, que já contribuiu para a rematrícula de mais de 311 mil crianças, adolescentes e jovens que estavam fora da escola ou com frequência irregular, com atenção especial às adolescentes mães.
Do lado da empregabilidade, a gerente de relacionamento com o setor privado do 1MiO, Lívia Felix de Matos, explica que o foco não é apenas garantir o acesso das jovens mães às vagas, mas assegurar a permanência e a progressão profissional.
“Muitas empresas até investem na diversidade na porta de entrada, mas, ao longo da carreira, os quadros vão ficando cada vez mais homogêneos. Por isso, trabalhamos para transformar a cultura organizacional e garantir que a maternidade não seja um fator de exclusão”, ressalta Lívia.
Segundo Matos, o programa atua junto às empresas para ampliar a consciência sobre competências e saberes desenvolvidos pelas jovens mães, como responsabilidade, organização e resiliência, além de promover políticas de cuidado e ambientes mais inclusivos. “Essas jovens querem trabalhar, querem se desenvolver. O que falta, muitas vezes, é uma rede de proteção e de cuidado que permita essa permanência”, conclui.
Entre 2023 e 2025, período com maior volume de oportunidades geradas, 51% das vagas foram ocupadas por mulheres, e 32% por jovens negros. Do total de inserções, 71% corresponderam a empregos formais, 16% a contratos de aprendizagem e 10% a estágios. A maior parte das formações foi concluída por adolescentes de 14 a 17 anos, reforçando o foco do programa na transição positiva entre escola e trabalho.
A iniciativa também prioriza grupos historicamente excluídos, como jovens de periferias urbanas e zonas rurais, mães adolescentes e jovens, pessoas com deficiência, população LGBTQIAPN+, povos indígenas, quilombolas e jovens egressos do sistema socioeducativo.
Histórias que mudam trajetórias
Para o chefe de Políticas Sociais do Unicef no Brasil, Gustavo Heidrich, os números ganham sentido quando traduzidos em histórias reais. “Ao longo desses cinco anos, vimos jovens que estavam fora da escola, em situação de trabalho infantil ou sem qualquer perspectiva, conseguirem reconstruir seus projetos de vida por meio da inclusão produtiva”, afirma.
Ele cita o caso de Ana Júlia, de 16 anos, que havia abandonado os estudos e foi mobilizada por outros jovens da rede do 1MiO. “Ela voltou para a escola, fez cursos na plataforma e hoje consegue olhar para o futuro com outras possibilidades. Essas histórias precisam ser contadas para mobilizar toda a sociedade”, defende.
Próximo passo: retenção e futuro
Segundo Lívia Felix de Matos, integrante da coordenação da iniciativa, o desafio agora vai além do acesso. “Não basta incluir jovens no mercado de trabalho. É preciso garantir retenção, progressão de carreira e perspectivas reais de futuro. Isso exige pensar a trajetória do jovem de forma integrada, conectando educação, empregabilidade e projeto de vida”, ressalta.
Com atuação em 1.844 municípios, oito capitais e parceria com mais de 240 empresas, além de governos e organizações sociais, o 1MiO integra a coalizão global Generation Unlimited, presente em 57 países. Para Mônica Dias Pinto, o Brasil vive uma janela decisiva.
“Temos algumas décadas para aproveitar esse bônus demográfico. O país precisa de um projeto nacional para essa geração, garantindo educação de qualidade, cumprimento da lei da aprendizagem e trabalho digno. Nada sobre juventude pode ser feito sem a juventude”, conclui Mônica.
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